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A LIBERDADE DE DEUS EM GÊNESIS 1

Foto do escritor: Economia e EvangelismoEconomia e Evangelismo


Ora, o Senhor é o Espírito, e onde o Espírito do Senhor está, aí está a liberdade.

                     2 Coríntios 3:17


INTRODUÇÃO


Quando o apóstolo Paulo afirma que a liberdade reside no mesmo lugar que o Espírito de Deus, ele não faz uma afirmação qualquer. Muito ali está sendo dito tanto a respeito de quem Deus é quanto do que é a liberdade. O Espírito de Deus, que carrega consigo a mais genuína liberdade, originalmente se encontra no próprio Deus, por óbvio. Logo, se desejamos entender o que significa a palavra liberdade em seu sentido mais pleno, necessitamos avançar para além de como entendemos a liberdade humana em si mesma e tentar compreender primeiramente como Deus desfruta de Sua natureza livre, o que é capaz de lançar muito maior luz sobre a forma com que compreendemos nossa própria liberdade.

Como cristãos, além disso, quase a totalidade de nossas vidas é orientada de acordo com o que nos vem à mente quando pensamos em Deus. Isso é suficiente para que lutemos por professar uma fé em um Deus que se revela na Bíblia e não em fontes duvidosas. Se os textos sagrados afirmam um Deus livre e nossa fé está depositada em um Deus que não o é, estamos no perigo da superstição tanto quanto quem crê em deuses de barro ou madeira. Não há segurança em uma descrição de Deus que não seja a que Ele próprio ofereceu. Deus é a pessoa mais indicada para falar sobre Si mesmo. Com isso quero dizer o que ninguém seguramente condenará: compreender Deus até os limites do que nos foi outorgado é muito bom e mesmo necessário. E uma vez que Deus seja livre, fazemos muito bem em compreender tanto quanto possível a natureza dessa liberdade divina, o que muito nos ajudará a compreender a humana.

Dito isso, a proposta que aqui faço é que nos lembremos de um dos capítulos da Bíblia, senão O capítulo da Bíblia, que mostra com mais cores quem Deus é e como Ele exerce Sua liberdade. O primeiro capítulo das Sagradas Escrituras, que apresenta Deus criando livremente, oferece uma quantia quase interminável de lições a respeito de Deus e do modo com que Ele exerce Sua liberdade criativa. Além disso, é fato que se alguém abrir um livro na primeira página e o autor ali afirmar que a segunda letra do alfabeto é o B, você estará seguro de que, se for um livro sério, ele não dirá mais adiante que a segunda letra do alfabeto é o C. De forma semelhante, podemos estar seguros de que, se a Bíblia começa afirmando uma coisa, ela não descambará mais adiante para uma afirmação contrária. Se o primeiro capítulo da Bíblia apresenta Deus de um modo, podemos estar certos de que, ao longo do restante do livro, é do mesmo Deus que se está falando. Se a Bíblia é consistente e séria como cremos ser, é o Deus da primeira página a que se está fazendo referência ao longo de todo o Livro, até o amém de Apocalipse 22:21.

Tendo sempre em mente colocar os holofotes sobre o Deus de Gênesis 1, portanto, o presente texto foi organizado da seguinte forma: a primeira parte, que é breve, traz algumas definições importantes e serve à desambiguação de termos e expressões. A segunda parte apresenta uma rápida retomada histórica da interpretação tradicional de Gênesis 1 e levanta alguns defeitos sérios nela. A terceira parte, em seguida, apresenta e discute algumas tentativas recentes de reabilitar a visão tradicional e compatibilizá-la com um Deus livre, demonstrando que não foram feitos significativos avanços. A quarta parte é uma leitura direta de Gênesis 1 sob as lentes da teologia tradicional, com o que pretendo demonstrar a incompatibilidade entre ela e o texto na sua pureza. A quinta parte, por sua vez, é a mesma leitura direta do texto, porém com pausas para avaliar seus detalhes mais impressionantes que apontam para a liberdade divina. A sexta e última parte adentra nos primeiros versos de Gênesis 2, é uma avaliação dos sérios danos que a teologia tradicional causa à fé adventista, em especial à doutrina do sábado, e reafirma a necessidade de uma visão mais literal do texto bíblico e da liberdade divina ali contida, para a sustentação da santidade do dia de guarda sabático. Por fim, uma conclusão geral é feita.


PARTE 1 – ALGUMAS DEFINIÇÕES IMPORTANTES


Para deixar um pouco mais claro o que pretendo dizer no presente texto, um rápido esforço de desambiguação pode ser valioso. Alguns termos e expressões podem causar confusão e vale a pena deixar bem claro o que tenho em mente quando os utilizo.

Por liberdade, primeiramente, entenda-se capacidade para criar ou suscitar coisas completamente novas e escolher aquilo que ainda não existe, ultrapassando o que já existe. Por livre arbítrio, consequentemente, entenda-se o poder de escolha UNICAMENTE entre opções previamente dadas. A liberdade é o poder de superar o existente e o livre arbítrio é o poder de escolher uma entre duas ou mais opções já existentes.

Por onipotência entenda-se a capacidade para executar tudo quanto é possível dentro dos limites lógicos e por onisciência entenda-se a capacidade para saber tudo quanto é possível saber dentro dos limites do que existe ou é possível existir. Atemporalidade se refere ao atributo daquilo que não interage com o tempo e temporalidade, por sua vez, ao atributo daquilo que interage.

Sempre que os termos onipotência e onisciência forem seguidos pelos adjetivos platônico, agostiniano, luterano, calvinista ou arminiano, entenda-se a mesma coisa: no primeiro caso, que Deus é capaz de realizar tanto as coisas lógicas quanto as ilógicas, e, no segundo caso, que Ele é capaz de saber tanto o que já é ou está determinado quanto aquilo que de forma indeterminista não está ainda decidido. Em outras palavras, que Ele é capaz de saber tudo o que é e também o que não é.


PARTE 2 – O QUE A TEOLOGIA JÁ DISSE SOBRE A LIBERDADE DE DEUS


Lutero, com todas as letras, afirmou categoricamente que os seres humanos não são livres para fazer escolhas e que, portanto, alguém as faz por eles. Quem possuiria liberdade genuína para fazer essas escolhas pelo homem senão o próprio Deus? Entretanto, tanto Lutero quanto Calvino não reconheciam um Deus genuinamente livre que faz escolhas. Ao invés disso, criam que Deus em sua cabal onipotência, onisciência e atemporalidade, fez apenas uma única escolha genuína e tomou apenas uma única decisão importante: a de criar de um só golpe tudo quanto já existiu, existe ou existirá. Trata-se de um Deus que decretou a história completa de toda a existência em um único e definitivo ato criativo. Ele olha para os fatos dessa história como quem olha para um quadro na parede. Efetivamente, não há mais nada a se fazer e nenhuma ocasião para se exercer liberdade. A liberdade aqui não é um atributo tão importante quanto a impassibilidade. Nessa doutrina, Deus simplesmente não necessita de liberdade ou não a quer. Ele usou toda liberdade de que precisava para executar a criação. Desde então, apenas assiste. Ou, na melhor das hipóteses, realiza apenas aquilo que desde a eternidade anteviu que faria. É incapaz ou não quer valer-se de uma liberdade para fazer coisas completamente novas. Calvino, vale dizer, replicou e expandiu tal doutrina.

Ambos, Lutero e Calvino, eram grandes admiradores de Agostinho, teólogo católico dos séculos IV e V que desenvolveu a ideia de pecado original e depravação total do ser humano. Um dos mais importantes pais da Igreja, Agostinho foi quem imortalizou a ideia de que Deus habita no “eterno agora”, com isso querendo dizer que Deus não está sujeito ao tempo. Leiamos um breve trecho de suas Confissões:


E tu não precedes os tempos pelo tempo: se não fosse assim, não precederias todos os tempos. Mas tu precedes todos os tempos passados pela alteza da eternidade sempre presente e superas todos os tempos futuros, pois eles são futuros, e quando vierem, serão tempos passados; mas tu és idêntico a ti mesmo, e teus anos não se apagam. Os teus anos nem vão nem vêm; esses nossos vão e vêm, para que todos venham. Os teus anos permanecem todos simultaneamente, porque permanecem, e os que vão não são excluídos pelos que vêm, pois não transitam; mas esses nossos anos todos existirão quando todos não existirem. Os teus anos são um único dia, e o teu dia não existe dia após dia, mas hoje, pois o teu hoje não cede lugar para o amanhã; pois ele tampouco sucede o ontem. O teu hoje é a eternidade; por isso geraste coeterno aquele a quem disseste: “Eu hoje te gerei” Tu fizeste todos os tempos e tu existes antes de todos os tempos, e não foi em algum tempo que não existiu o tempo.

Agostinho, Confissões, livro XI, cap. 13, parágrafo 16


Quando Agostinho afirma que os anos de Deus nem vão nem vêm, está afirmando que Ele é atemporal, no sentido de que não está sujeito ao tempo. Deus não vê sucessões de acontecimentos, mas todos os acontecimentos ao longo do tempo como um único evento. Ou seja: para Deus existe apenas um estático presente. Na teologia agostiniana temos assim um impasse entre o “eterno agora” de Deus e Sua liberdade criativa: que tipo de liberdade Deus pode exercer em relação à Sua criação se toda a história já está decidida e é uma única cena que se afigura diante dEle como um momento indivisível? Se o Seu decreto criador em todos os mínimos detalhes e durante todo o decurso do tempo é irrevogável e não permite quaisquer modificações, aditivos, reformas ou atos semelhantes, ao menos em relação à presente criação Deus não é de forma alguma livre. Ao contrário, ainda que Ele sofresse de um irremediável afã criativo ou intervencionista (Agostinho, Lutero e Calvino criam não ser o caso), precisaria se contentar com a prisão em que por livre escolha Se colocou. Nessa tradição, aliás, Deus nem mesmo se incomoda com essa espécie de prisão, uma vez que é impassível. Ou seja, Agostinho propõe que Deus está contente em Sua absoluta inércia. Portanto, seria bastante controverso afirmar que há liberdade no Espírito de Deus, uma vez que, na abordagem protestante convencional herdada de Agostinho, Deus não é realmente livre e nem mesmo dá valor à liberdade. Antes, trata-a com total apatia. Como veremos adiante, Gênesis 1 não faz jus a essa doutrina. Nesse capítulo está relatada a criação de Deus ao longo do tempo e não acima dele. A completa transcendência divina em relação à sucessão de acontecimentos não significa onipotência, mas justamente o contrário disso: completa incapacidade de ação criativa e, portanto, ausência total de liberdade.

Importante ainda lembrar que Agostinho não elaborou a ideia de um Deus atemporal a partir do nada (como Deus costuma fazer). É reconhecido o fato de que sua grande inspiração era o filósofo grego Platão:


“Agostinho posicionou-se como um defensor da tese de Justino: de que a filosofia grega antiga, mesmo sendo pagã, forneceria um meio de compreensão de questões fundamentais para o cristianismo.” 1


“Santo Agostinho foi uma das principais figuras que mesclou filosofia grega com as tradições religiosas judaica e cristã.”2


  A enciclopédia Stanford, a respeito de Agostinho, registra ainda:


“Ao longo de sua obra, ele se envolve com a filosofia pré e não cristã, muitas das quais ele conhecia de primeira mão. O platonismo, em particular, permaneceu um ingrediente decisivo de seu pensamento.”3


A influência platônica sobre Agostinho é inegável. O imutável e atemporal deus das formas proposto por Platão na República e em outros de seus livros é o ponto de partida agostiniano para a compreensão de Deus. Essa questão foi mais amplamente abordada aqui:



Mas retomemos agora a partir de Calvino: sabemos que a fé calvinista trouxe para si muitos problemas ao rejeitar o livre arbítrio humano por meio da crença na eleição incondicional, mas sua implicação mais desastrosa, que de forma surpreendente não suscitou muita oposição, foi a de que Deus, ao ter executado um solitário decreto unilateral e irrevogável para toda a história, junto com qualquer possibilidade de uma existência humana livre, acabou com Sua própria liberdade. Não muito tempo depois de tomar forma a doutrina calvinista, Molina e Armínio, por exemplo, levantaram questionamentos e propostas para inserir novamente o livre arbítrio humano na equação teológica, mas não questionaram o aprisionamento divino. O que causava incômodo no determinismo de Lutero e Calvino, por mais incrível que isso soe, não era sua óbvia implicação de que nele não há espaço para Deus agir livremente, mas antes a constatação de que o HOMEM nele não é livre. Muitos ficaram chocados diante do postulado de que o ser humano não possui livre arbítrio, mas ninguém pareceu se ofender com a declaração muito mais ousada de que Deus, após o decreto criador, também não o possui mais. Isso é perturbador, na medida em que a defesa do livre arbítrio humano é um completo fracasso quando não há confiança alguma na realidade e atualidade do livre arbítrio e liberdade divinos, tal como se verá adiante.

A fim de avançar para além do determinismo calvinista que retirava do ser humano o livre arbítrio, Molina defendeu a ideia de que Deus conhece tudo que cada ser humano faria em cada situação específica. O jesuíta católico chamou de contrafactuais essas escolhas que o ser humano não fez porém certamente TERIA FEITO se a ocasião apropriada lhe fosse apresentada. Esses quase-fatos, cuja real existência pode ser seriamente questionada, são o frágil argumento para sustentar, nessa doutrina, o livre arbítrio humano. Entretanto, nenhuma tentativa foi empreendida mesmo para dizer que há contrafactuais no universo das escolhas divinas. O custo de tal proposta certamente teria sido bastante alto, uma vez que atacaria fundamentos agostinianos. É improvável, além disso, que a iniciativa tivesse resultado na concessão de significativa liberdade a Deus, uma vez que a ideia como um todo não se provou muito convincente em sua proposta de restaurar a liberdade humana e portanto falhou em seu principal objetivo. De qualquer forma, ao menos teria sido uma tentativa. O molinismo está com a popularidade novamente em alta (ou está sendo popular pela primeira vez). Na próxima parte, serão rapidamente consideradas as implicações de uma versão atualmente popular dessa teologia, em termos de sustentação da liberdade divina.

Considera-se que Jacó Armínio, que nasceu pouco antes da morte de João Calvino, desafiou o sistema teológico calvinista, do que discordo. Lembremos do beabá teológico: no calvinismo, Deus decretou desde a eternidade toda a história, aí inclusas todas as escolhas individuais de quaisquer seres. Deus conhece todo o futuro porque o decretou. No arminianismo, Deus também decretou desde a eternidade toda a história e todas as escolhas dos indivíduos, mas de uma outra forma: quando, na eternidade pregressa, Ele olhou para o futuro e o enxergou em sua completude, no mesmo instante decretou a inexorabilidade de sua existência, por meio de Sua onisciência. Nas palavras do próprio Armínio, Deus decreta por meio de Sua onisciência 4:


“A estes sucede o quarto decreto, pelo qual Deus decretou salvar e condenar certas pessoas em particular. Este decreto tem seu fundamento na presciência de Deus, pela qual ele conheceu desde toda a eternidade aqueles indivíduos que, através de sua graça preventiva, acreditariam, e, através de sua graça subsequente, perseverariam, de acordo com a administração descrita anteriormente daqueles meios que são adequados e próprios para conversão e fé; e, por essa presciência, ele também conheceu aqueles que não acreditariam e não perseverariam.”


O arminianismo e o calvinismo são, em realidade, praticamente a mesma doutrina. Ambos estão baseados na atemporalidade de Deus nos moldes platônicos e afirmam uma realidade intertemporal estática da qual Deus é completamente onisciente. O arminianismo apenas procurou retirar de Deus a responsabilidade pelo mal, na medida em que propõe que Ele apenas o enxergou futuro adentro ao invés de decretá-lo. Essa absolvição de Deus o arminianismo não atingiu, mas o escopo do presente texto não cobrirá essa questão, que aliás já foi suficientemente debatida. Cabe aqui apenas frisar que, ao preservar a ideia de que Deus é atemporal e reforçar a noção de uma inerrante onisciência divina para toda a história, o arminianismo manteve Deus trancado na prisão da atemporalidade: a história já está contada e decidida e não há nada que Deus possa fazer a respeito. Ele não possui a prerrogativa de iniciar atos criativos a partir do nada. Nesse aspecto, o arminianismo é até mesmo um pouco pior que o calvinismo, que postulava que Deus havia exercido ao menos um ato criativo, no momento em que arrematou seu primeiro e último decreto criativo eterno. No arminianismo, não está certo se sequer isso Ele tenha feito, uma vez que Ele VIU toda a história ao invés de decretá-la. Parece ter sido o caso que ninguém criou nada ou, o que é pior, outros seres que não Deus tenham criado à partir do nada. Nessa doutrina, portanto, Deus não apenas não possui liberdade hoje, neste exato momento, mas em realidade NUNCA possuiu.

Até o momento, os esforços mais sérios para reabilitar a convicção na liberdade de Deus estão sendo empreendidos fora da ortodoxia teológica, inclusos aí o calvinismo, o arminianismo e o molinismo. Navegando fora desses filhos da filosofia grega, temos um conjunto considerável de razões para crer que Deus é livre de uma forma soberana e genuína e que uma fé sadia precisa considerar a realidade da liberdade divina, em especial entre as fileiras do adventismo, o que veremos na parte 6.


PARTE 3 – DUAS TENTATIVAS QUE QUASE APRESENTARAM UM DEUS LIVRE


Dentro da ortodoxia teológica, há tentativas bem-intencionadas de desfazer a caricatura com que se costuma caracterizar Deus. Vou mencionar aqui duas delas e procurar demonstrar que, não obstante os esforços sinceros, essas visões no final das contas não apresentam um Deus livre: a proposta da onisciência dinâmica, que se assemelha ao molinismo, e a teodiceia do amor, que parece um apanhado geral de tendência arminiana.

A proposta da onisciência dinâmica estabelece que Deus não possui uma única onisciência estática operando desde a eternidade. Ou seja, Deus não está olhando para a história como se ela fosse um quadro pendurado na parede, mas antes algo como múltiplas telas de computador que apresentam novas informações a respeito do futuro em tempo real. Essas projeções do futuro se alteram na medida em que decisões livres são tomadas e Deus responde apropriadamente a elas. Entretanto, vale destacar que, uma vez que afirmemos que as projeções em relação ao futuro de fato se alteram, não temos mais um cenário de linearidade do tempo, embora Deus ainda seja onisciente desde a eternidade. Nesse caso, Ele necessariamente soube desde a eternidade pregressa QUAIS MUDANÇAS efetivamente ocorreriam e quais não. Afirmar que Deus possui onisciência dinâmica, no final das contas, é o mesmo que afirmar que Deus possui desde a eternidade uma onisciência estática de todas as futuras mudanças.

A ideia de onisciência dinâmica procura explorar a noção de contingência, ou seja, de que há ramificações de eventos futuros, sem entretanto rejeitar a noção tradicional de que Deus conhece exaustivamente todo o futuro. O resultado é que Deus conhece todas as contingências e também qual caminho cada uma delas tomará. Isso nos leva a perguntar de que tipo de contingências estamos falando. Deus as enxerga como possibilidades, mas também já conhece de antemão quais delas se concretizam e quais não. Como vimos na parte 2, essas possibilidades não concretizadas os molinistas chamam de contrafactuais. Em resumo, se Deus possui onisciência dinâmica, Ele conhece o futuro exaustivamente desde a eternidade e com isso conhece tudo o que ocorrerá e tudo o que poderia ocorrer e, no entanto, seguramente não ocorrerá. Se ocorresse um contrafactual em vez de um fato, seria o mesmo que dizer que Deus erra em saber o que ocorrerá e o que não. Os contrafactuais existem para não acontecer (de acordo com alguns molinistas, existem apenas para fins de condenação dos homens, uma vez que Deus sabe o que faríamos em cada circunstância). O resultado é que Deus agora não está mais enxergando apenas um quadro na parede. Ele está vendo um quadro que representa a fidedigna realidade de toda a história e trilhões de outros quadros que Ele próprio desejou pintar ou que alguém colocou diante dEle por algum motivo, mas que em realidade não existem nem nunca existirão.

As implicações para a justiça de Deus são óbvias: nesse cenário, Deus condena os indivíduos por coisas que eles de fato nunca fizeram. A liberdade humana também ali inexiste: desde a eternidade já está posto tudo o que você escolheu ou escolheria. Entretanto, o que é importante para nós no momento: nesse cenário Deus não é livre. Não o é pelo seguinte motivo: sendo completamente onisciente, Deus não possui poder nem mesmo para escolher contrafactuais. Dos trilhões de quadros que se afiguram diante de Deus, Ele não pode decidir que um seja realidade em vez de outro. Os quadros estabelecidos desde a eternidade como contrafactuais são em sua natureza fictícios. Se Deus procurasse transformar algum deles em realidade, no mesmo instante em que o fizesse negaria Sua própria onisciência da qual dispõe desde a mais remota eternidade. Ao transformar um quadro contrafactual fictício no quadro da realidade, Ele errou em Sua previsão de que aquilo seria um contrafatual e não um fato concreto. Em outras palavras, Ele estaria errado a respeito de como determinada contingência se comportaria. Deus pode olhar para o futuro real e os fictícios e enxergá-los tais como Ele determinou no início, mas não pode transformar um futuro real em um fictício ou vice-versa. Deus tem muita coisa para ver, mas nada para fazer, mudar ou criar.

A onisciência dinâmica, ao contrário do que o nome sugere, no fim das contas apenas amplia a quantidade de informações estáticas que Deus enxerga desde a eternidade. Para ser efetivamente dinâmica, precisaria deixar de ser onisciência. O que quero dizer é: não há como preservar as bases platônicas de imutabilidade e atemporalidade, que sustentam a ideia de onisciência, ao mesmo tempo em que se pretende conferir dinamismo à forma com que Deus adquiri conhecimento. Ou Deus possui de antemão todo o conhecimento (onisciência) ou Ele o adquiri ao longo da sucessão de acontecimentos (dinâmico). A ideia de onisciência está inevitavelmente atrelada à completa atemporalidade divina e não há como afrouxá-la chamando-a de dinâmica sem derrubar os pressupostos platônicos ou agostinianos, coisa que os proponentes dessa teologia seguramente não estão dispostos a fazer. Se estivessem, talvez pudessem chegar à compreensão de que Deus, sendo livre, de fato pode ter diferentes conhecimentos em relação ao futuro ao longo do tempo, uma vez que, ao exercer Sua liberdade, pode decidir HOJE por um futuro diferente daquele que enxergava ontem. Isso é algo efetivamente dinâmico, que assegura a fé em um Deus livre, mas não é isso que se pretende afirmar com a ideia de onisciência dinâmica, infelizmente.

Agora vamos a uma proposta genuinamente adventista: a teodiceia do amor, de John Peckam 5. Este autor propõe a ideia de que Deus possui duas vontades distintas: a ideal e a remedial. A vontade ideal de Deus seria aquela existência maravilhosa que Ele anteviu desde o princípio e a vontade remedial seria aquela que Ele exerce com base no mundo real das contingências, onde há maldade e podridão. Trata-se de uma nobre tentativa de solucionar alguns dos horrores provenientes da ideia de atemporalidade divina, sem entretanto romper com a ortodoxia, que é nada senão atemporalidade divina.

O que Peckam está fazendo é reafirmar sua fé no Deus onipotente, onisciente, imutável e atemporal da filosofia platônica representado no Deus que possui uma vontade ideal, que nada mais é que aquele quadro perfeito e estático pendurado na parede, enquanto tenta se livrar dessa mesma fé ao afirmar que Deus possui também uma vontade mais pragmática, que ele chama de remedial. Essa, ele explica, manifesta-se nos momentos de tensão com a dura realidade dos fatos, que são contrários ao quadro perfeito estabelecido por Sua vontade ideal. Em resumo, a vontade ideal se refere a um sonho distante e utópico, ao passo que a vontade remedial é a que faz os ajustes de curto prazo necessários ao atingimento deste sonho.

Qualquer estudante de filosofia grega facilmente identificará que o Deus que possui uma vontade ideal é o próprio Deus de Platão na Sua forma mais pura, sem nada que por ou tirar, e que o Deus que possui uma vontade remedial é o próprio Demiurgo de Platão na sua forma mais pura, sem nada que por ou tirar. As semelhanças com o Demiurgo são impressionantes. Observe o que Peckam escreve:


“Deus, em Sua sabedoria perfeita, que leva em conta todos os fatores e todas as opções disponíveis.”


“Deus sempre faz o que é melhor, levando em conta os meios a Ele disponíveis”


As duas afirmações se encontram nas páginas 149 e 150 de sua Teodiceia do Amor, respectivamente.


Ora, Demiurgo, segundo Platão, é o deus da matéria, um deus inferior ao Deus das formas e que não é capaz de criar à partir do nada. Ao afirmar que Deus, em Sua vontade remedial, faz apenas uma escolha entre opções ou meios DISPONÍVEIS, Peckam admite com todas as letras que Deus NÃO cria à partir do nada. E a pergunta é: Se Deus, ao exercer Sua vontade remedial, NÃO PODE INVENTAR OPÇÕES OU MEIOS, alguém deve ter colocado essas opções e meios ali. Platão resolveria facilmente esse dilema, afirmando que o deus das formas estabelece essas opções e esses meios e o Demiurgo escolhe entre eles, mas Peckam não pode fazer o mesmo, pois precisa afirmar que o Deus platônico e o Demiurgo são uma só coisa. Ao dizer que Deus possui uma vontade ideal, Peckam deixa claro que o Deus que ele tem em mente é platônico e atemporal e, portanto, um Deus que está preso em Sua atemporalidade. Peckam tenta livrá-Lo dessa prisão ao afirmar que Deus possui uma outra vontade, a remedial, onde Ele está exposto à temporalidade. O autor sugere que essa é uma vontade exercida livremente ao longo do tempo, mas, nesse caso, a esfera de ação se dá apenas no curto prazo, pois a vontade ideal de Deus, que estabelece os rumos últimos do Universo, é inevitável e fixa desde a eternidade. A Deus caberia apenas manobras operacionais de curto prazo e nunca alguma mudança significativa nos rumos mais elevados de Sua própria criação, que de qualquer forma já estão fixos. Deus pode usar sua criatividade para remediações pontuais e esse é o espaço que Peckam confere à Divindade para que Ela exerça Seus talentos.

Mas mesmo ao exercer Sua vontade remedial, Deus de fato não é livre, como o próprio autor deixa escapar ao afirmar que diante dEle estão apenas algumas opções e meios previamente disponibilizados e não uma genuína liberdade de criar a partir do nada. Um Deus que tem diante de Si apenas opções e meios momentaneamente disponíveis, por maior que seja esse conjunto de opções e meios, não é efetivamente livre. Para melhor demonstrar essa questão, pensemos em dois modelos de provas de conhecimento: uma em que você deve fazer a escolha certa entre cinco alternativas de 100 diferentes questões e outra em que você recebe uma folha em branco e uma caneta e deve escrever sobre um tema. Na primeira prova, independentemente das marcações que a pessoa faça, qualquer combinação delas é previamente conhecida e portanto está circunscrita a um universo previamente limitado. Independentemente de quantas ou quais questões você acerte, o resultado final é SEMPRE PREVISÍVEL, uma vez que inserido em um espaço amostral que já era conhecido. Nesse cenário, pode existir livre arbítrio, se considerarmos que ao menos uma das alternativas é moralmente aceitável, mas não há liberdade. Na prova dissertativa, por outro lado, a resposta é simplesmente impossível de ser prevista, pois a combinação de gêneros, estilos, organizações sintáticas, palavras e expressões é realmente infinita e não dá margem para o levantamento de um espaço amostral. Trata-se aí de um ato eminentemente criativo, que envolve liberdade.

É evidente que, se Deus faz escolhas ou cria a partir de opções previamente estabelecidas, alguém certamente deverá ter colocado lá essas opções, assim como uma banca organizou as questões e alternativas da prova. Nesse caso, Deus é apenas um adolescente sentado em uma sala de vestibular resolvendo questões de múltipla escolha cujas alternativas uma banca definiu previamente. Como é simplesmente absurdo afirmar que alguém estava lá antes de Deus para estabelecer essas opções, é evidente que o próprio Deus é quem deverá tê-lo feito. E é isso que Peckam está fazendo: Ele quer que Deus seja ao mesmo tempo a banca e o vestibulando. Na posição de banca, Deus propõe todas as alternativas disponíveis para Si mesmo. Na posição de vestibulando, para surpresa de ninguém, Deus, ainda preso à Sua condição de banca, sempre escolherá aquela alternativa que, em Sua perfeita onisciência, decretou como a certa. Além disso, como vestibulando marcando alternativas certas e erradas, Deus não teria o poder de simplesmente marcar todas as alternativas como incorretas e escrever no lugar, discursivamente, a resposta que entende correta, pois Peckam deixa claro que Deus não escreve respostas dissertativas, mas resolve questões de múltipla escolha. Mas qual é o sentido de se afirmar que Deus de antemão FIXOU opções de escolha para Si mesmo a fim de exercer Sua liberdade a partir delas? Um Deus livre certamente é capaz criar como quem disserta.

Assim entendemos que Peckam gostaria de ter proposto, mas não propôs um Deus efetivamente livre tal como a Bíblia O descreve. Ao afirmar que Deus e Demiurgo combinados são o Deus bíblico cristão, Peckam piorou em muito a nossa já triste síntese cristã platônica, a qual, moribunda como está, ao menos rejeita a grotesca ideia de um Demiurgo. O calvinismo, que abraçou apenas o Deus platônico e descartou o Demiurgo, é de fato superior à Teodiceia do Amor de Peckam, que integrou não apenas um, mas dois deuses gregos em uma teologia cristã. Discípulo de Platão, Peckam já devia saber que Deus e Demiurgo não podem ser a mesma pessoa. Simplesmente não dá certo. Se Peckam quiser preservar as tradições filosófica gregas e ainda assim ser monoteísta, tal como professa ser, precisará se decidir entre um e outro. O melhor mesmo seria esquecer todos os deuses e pensadores gregos e olhar para a Bíblia, tarefa que agora empreenderemos.


PARTE 4 – GÊNESIS 1 LIDO ATRAVÉS DAS LENTES DA TEOLOGIA TRADICIONAL


A reforma protestante nasceu a partir da linda ideia da Sola Scriptura, qual seja, a de que a única norma de fé legítima é a que se origina integralmente da Bíblia. Entretanto, hoje sabemos bem que intermináveis séculos de filosofia grega impregnada na fé cristã não podem ser desmascarados da noite para o dia. O próprio Lutero, de quem aprendemos que a Bíblia é a única Autoridade para as questões da fé e em quem não há culpa, não estava na melhor das condições para compreender e praticar tão nobre princípio. Tinha sobre si toneladas de dogmas gregos a partir dos quais se valia para interpretar a Bíblia e dos quais não teria como facilmente se livrar, mesmo se lançasse mão da mais ferrenha obstinação que lhe era característica. Parecia não ser o tempo para um empreendimento tão gigantesco. À época, todos nasciam e morriam agostinianos.

Hoje estamos em muito melhor situação que Lutero. Temos à nossa disposição a história de tudo que desde então transcorreu, em especial o fracasso dos sistemas teológicos protestantes tradicionais que certamente contribuíram para levar o mundo a uma rejeição generalizada da religião e à preferência ao niilismo. Hoje, felizmente, podemos dar um passo atrás e enxergar o tamanho do entulho. E é justamente isso que gostaria de aqui propor, a saber, que observemos o relato bíblico direto de Gênesis 1 colocado ao lado do entulho teológico acumulado. Para tanto, passemos verso a verso pelo primeiro capítulo da Bíblia, comparando a Bíblia King James (BKJ) com a Bíblia na Nova Versão Verdadeira (NVV), versão fictícia que aqui proponho para representar o mais fielmente possível o entendimento protestante e evangélico das Sagradas Escrituras.


BKJ (1) No princípio criou Deus o céu e a terra.

NVV (1) De uma ponta da eternidade à outra, sem um marco temporal específico, Deus criou tudo de uma só vez. Deus não criou o céu e a terra inicialmente e outras coisas posteriormente. Isso é uma ilusão da mente humana.


BKJ (2) E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo. E o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas.

NVV (2) E desde o início a terra já era completa e não lhe faltava nada. O Espírito de Deus NÃO se movia sobre a face das águas, pois Deus é completamente transcendente e não faz coisas que os homens fazem, como se mover, por exemplo.


BKJ (3) E disse Deus: Haja luz; e houve luz.

VCP (3) E Deus não disse mais nada a respeito de coisas a serem criadas, pois a criação já estava completa desde a eternidade em um único ato criativo. Deus dar ordem para criar a terra e depois outra ordem para criar luz, em uma sucessão de eventos temporais, é apenas uma ilusão humana.


BKJ (4) E viu Deus a luz, que isto era bom; e Deus separou a luz das trevas.

NVV (4) E Deus já tinha visto a luz e já sabia exatamente como ela era, antes de criá-la. E já sabia que era boa. E a luz e as trevas já estavam separadas desde a eternidade.


BKJ (5) E chamou Deus à luz Dia, e às trevas ele chamou Noite. E houve a tarde e a manhã, o primeiro dia.

NVV (5) E Deus não precisou dar nome à luz, porque ela já existia e portanto já tinha um nome. O mesmo vale para a noite. E esse não foi o fim do primeiro dia, porque dias não existem em realidade, mas apenas na pecaminosa mente humana. Aliás, já existia nesse momento essa ilusão na cabeça do homem muito embora ele ainda não existisse, pois de fato o homem já existia desde o primeiro dia da Criação, uma vez que Deus fez tudo de uma só vez, de modo atemporal.


BKJ (6) E disse Deus: Haja um firmamento no meio das águas, e deixe que separe as águas das águas.

NVV (6) E Deus não deu nenhum comando criativo adicional. Não havia necessidade.


BKJ (7) E fez Deus o firmamento, e separou as águas que estavam debaixo do firmamento das águas que estavam acima do firmamento. E assim foi.

NVV (7) E Deus não criou nenhuma outra coisa. Tudo já estava criado.


BKJ (8) E Deus chamou ao firmamento Céu. E houve a tarde e a manhã, o segundo dia.

NVV (8) E Deus não deu mais nenhum nome a nada, porque tudo já tinha nome. E não se encerrou mais nenhum dia, porque dias são apenas devaneios humanos.


BKJ (9) E disse Deus: Deixe as águas sob o céu em um lugar, e apareça o solo seco. E assim foi.

NVV (9) E Deus não disse mais nada.


BKJ (10) E chamou Deus ao solo seco de Terra; e ao ajuntamento das águas ele chamou Mares. E Deus viu que isto era bom.

NVV (10) E Deus não deu mais nome a nada, porque tudo já tinha nome, desde a eternidade. E Deus sempre soube que separar a Terra dos Mares seria bom. Depois que viu isso feito, não teve nenhuma reação especial.


BKJ (11) E disse Deus: Deixe a terra trazer a relva, a erva produzindo semente, e a árvore frutífera produzindo fruto segundo a sua espécie; cuja semente esteja em si mesma, sobre a terra. E assim foi.

NVV (11) E Deus não disse mais nada. Tudo que Ele precisou dizer, passado, presente e futuro, disse de uma só vez. Depois não disse mais nada.


BKJ (12) E a terra produziu a relva, e a erva que dava semente segundo a sua espécie, e a árvore frutífera, cuja semente estava nela, segundo a sua espécie. E Deus viu que isto era bom.

NVV (12) E a terra produziu a relva, mas apenas na cabeça do homem, que vê sucessões de acontecimentos e que não tinha ainda sido criado, mas já sofria de alucinações em relação ao tempo. Na verdade mesmo, ele já tinha sido criado de modo atemporal.


BKJ (13) E houve a tarde e a manhã, o terceiro dia.

NVV (13) Nenhum dia mais se passou, pois dias só se passam na cabeça do homem. Ele não estava ali nesse momento ainda, mas, na verdade, já estava.


BKJ (14) E disse Deus: Haja luzes no firmamento do céu para dividir o dia da noite; e que sejam por sinais, e para estações, e para dias, e anos;

NVV (14) Deus não deu mais nenhum comando criativo. Deus já anteriormente tinha criado as estações, dias e anos para provocar no ser humano um delírio em relação ao tempo (inclusive em relação à santidade do sábado).


BKJ (15) E que eles sejam por luzes no firmamento do céu para dar luz sobre a terra. E assim foi.

NVV (15) Tudo já estava criado e o propósito de cada coisa já tinha sido definido desde a eternidade.


BKJ (16) E fez Deus duas grandes luzes; a luz maior para governar o dia, e a luz menor para governar a noite; ele também fez as estrelas.

NVV (16) E Deus não precisou fazer mais nada.


BKJ (17) E Deus os colocou no firmamento do céu para dar luz sobre a terra;

NVV (17) E Deus não fez mais nada. Essa intensa sucessão lógica de eventos é apenas uma forma que Deus encontrou de enganar os sábios dessa terra, fazendo-os pensar que podem usar lógica para entender as escrituras.


BKJ (18) E para governar sobre o dia e sobre a noite, e para separar a luz das trevas, e Deus viu que isto era bom.

NVV (18) Tudo Deus sempre soube que era bom, mesmo o que não existe, o que é ilógico e o que Ele nem pensou a respeito.


BKJ (19) E houve a tarde e a manhã, o quarto dia.

NVV (19) Dias não existem.


BKJ (20) E disse Deus: Produzam as águas abundantemente criaturas viventes que se movem, e aves que possam voar acima da terra, no vasto firmamento do céu.

NVV (20) E Deus não deu mais nenhum comando criativo.


BKJ (21) E Deus criou grandes baleias, e toda criatura vivente que se move, que as águas produziram abundantemente, segundo a sua espécie, e toda ave alada segundo a sua espécie; e Deus viu que isto era bom.

NVV (21) E Deus decidiu não criar mais nada. E mesmo se quisesse, Ele não poderia. Deus só pode criar tudo de uma vez só, sabendo de antemão que será bom.


BKJ (22) E Deus os abençoou, dizendo: Sede frutíferos e multiplicai-vos, e enchei as águas nos mares, e multipliquem-se as aves sobre a terra.

NVV (22) Deus não fez mais nada. As bençãos e as maldições de Deus são incondicionais e foram proferidas desde a eternidade. Em alguns casos, Ele amaldiçoou pessoas muito antes de elas existirem, pois Ele ANTEVIU que elas seriam pecadoras.


BKJ (23) E houve a tarde e a manhã, o quinto dia.

NVV (23) E se passou o quinto dia, mas apenas na cabeça do homem. Deus não vê a sucessão de dias. Todos os dias são o eterno agora.


BKJ (24) E disse Deus: Produza a terra criaturas viventes segundo as suas espécies, gado, e seres rastejantes, e animais da terra segundo a sua espécie. E assim foi.

NVV (24) Deus não disse mais nada e nada mais aconteceu, exceto na cabeça dos homens, que ainda não existiam.


BKJ (25) E fez Deus os animais da terra segundo a sua espécie, e o gado segundo a sua espécie e tudo que rasteja sobre a terra segundo a sua espécie; e Deus viu que isto era bom.

NVV (25) Desnecessário repetir que Deus não fez mais nada e que Ele sempre soube que os animais seriam bons, mesmo quando Ele nem tinha ainda pensado a respeito de incluí-los em Seu decreto criador único, muito embora Ele tenha pensado tudo de uma vez só.


BKJ (26) E disse Deus: Façamos um homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e que eles tenham domínio sobre os peixes do mar, e sobre as aves do céu, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre toda a coisa rastejante que rasteja sobre a terra.

NVV (26) E disse Deus: Façamos um homem de tal modo que ele seja COMPLETAMENTE CONTRÁRIO ao que Nós somos. Ele será temporal, fadado à completa depravação, sujeito a emoções e propenso à lógica. Mesmo pecador por natureza, Ele de alguma forma inexplicável terá até mesmo livre arbítrio, para que a distinção entre Nós e ele seja ainda maior, uma vez que não possuímos qualquer tipo de liberdade. E, por ser completamente contrário a Nós, o homem não terá domínio sobre nada. Ele não exercerá domínio. O meio é que o escravizará.


BKJ (27) Assim Deus criou o homem a sua própria imagem, à imagem de Deus o criou; macho e fêmea ele os criou.

NVV (27) Assim Deus criou o homem completamente contrário ao que Ele é.


BKJ (28) E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Sede frutíferos e multiplicai-vos, e reabasteça a terra e subjugai-a; e tende domínio sobre os peixes do mar, e sobre as aves do céu, e sobre toda a coisa vivente que se move sobre a terra.

NVV (28) E Deus já havia amaldiçoado o homem desde a eternidade, sabendo de antemão que ele era pecador.


BKJ (29) E disse Deus: Eis que vos tenho dado toda erva que dá semente, que está sobre a face de toda a terra, e toda árvore na qual está o fruto de uma árvore que produz semente; para vós será para alimento.

NVV (29) E Deus não disse nada ao ser humano, porque é impassível. Um Deus perfeito não interage com homens.


BKJ (30) E a todo animal da terra, e a toda ave do céu, e a cada coisa que rasteja sobre a terra, em que há vida, eu tenho dado toda erva verde para alimento. E assim foi.

NVV (30) Deus não conversa com homens.


BKJ (31) E Deus viu todas as coisas que ele havia feito; e eis que era muito bom. E houve a tarde e a manhã, o sexto dia

NVV (31) E Deus já tinha visto desde a eternidade tudo que havia feito e uma coisa era tão boa quanto qualquer outra. Não se passou mais nenhum dia, pois dias não existem.


O texto bíblico e a teologia agostiniana simplesmente não ornam. Se o princípio da Sola Scriptura fosse de fato observado no mundo cristão, Platão não teria nele muito espaço. A observação direta mostra que a Bíblia simplesmente não entra na sistematização teológica tradicional que aprendemos nas igrejas. Tentar colocá-la lá dentro é como tentar colocar um saxofone dentro de um tubo de pasta de dente. A afirmação de que Deus é atemporal, onisciente em relação a um futuro fixo, impassível ou incapaz de criar a partir do nada não se sustenta diante de uma leitura direta das Escrituras. E o que é pior: tal afirmação não se encaixa em um único verso sequer. O capítulo 1 de Gênesis, um dos mais importantes em termos de descrição dos atributos criativos de Deus, precisa ser descartado inteiramente se quisermos crer na versão oficial protestante (e católica) a respeito de quem Deus é.


PARTE 5 – GÊNESIS 1 EM UMA LEITURA LITERAL


Agora leiamos novamente o capítulo 1 de Gênesis, atentando-nos dessa vez para alguns detalhes impressionantes do texto. Consideremos aqui o princípio que o Espírito de Profecia nos orienta a seguir em relação à interpretação da Bíblia:


“A linguagem da Bíblia deve ser explicada de acordo com o seu ÓBVIO SENTIDO, a menos que seja empregado um SÍMBOLO ou FIGURA. Cristo fez a promessa: “Se alguém quiser fazer a vontade dEle, pela mesma doutrina conhecerá se ela é de Deus.” João 7:17.”

O Grande Conflito, p. 598.


BKJ (1) No princípio criou Deus o céu e a terra.


É bastante impressionante o fato de que o primeiro verso da Bíblia é suficiente para desmentir a filosofia grega impregnada no cristianismo. O verso está afirmando que Deus, partindo de um marco temporal, não atemporal, principiou a criação trazendo à existência algo específico dela e não toda ela. Deus cria por partes, em etapas, ao longo do tempo.


BKJ (2) E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo. E o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas.


A terra não estava completa. Apenas uma etapa estava concluída. Além disso, o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas, indicando desde já uma interação próxima à criação. Outro detalhe importante: cada ato criativo de Deus é autônomo em relação aos demais atos. Ou seja: não é porque Deus criou o céu e a terra que isso desencadeia uma automática e inevitável sucessão de eventos. Deus criou o céu e a terra e depois foi “passear” por essa criação ainda no estado bruto, sem nenhuma ansiedade inquietante por concluí-la. Poderia ter parado por ali, se assim desejasse. Não é a criação ou mesmo a ideia de criação que se apresenta diante de Deus como que fazendo exigências das quais Ele não pode se livrar. Mesmo o ímpeto criativo de Deus passa por Sua reflexão e poder decisório. Deus é soberano mesmo sobre Suas mais ardentes inclinações ou vontades, por mais santas e justas que sejam. A conclusão da primeira semana não se afigurava diante dEle como uma meta da qual não podia escapar.

Quando Deus cria, não se trata de incapacidade para resistir aos Seus próprios sentimentos, que sabemos ser intensos e muitos, ou Sua inclinação criativa, que sabemos ser enorme. O Criador até pode ser Alguém desesperadamente tomado por um impulso criativo, mas, dono de Si mesmo e imune à ansiedade, é calmo e circunspecto o suficiente para fazer tudo a Seu tempo, sem se esquecer dos detalhes. Deus cria a partir do nada, no Seu tempo e conforme Seu comando, não a partir de uma compulsão ou ansiedade. Nada O constrange ao ponto de dominá-Lo e nada ousa se impor diante dEle como uma necessidade. Ele se movia sobre a face das águas, dono de Si e de Seus próprios passos. E nisso Ele poderia ter passado quanto tempo quisesse. Isso é efetivamente criar a partir do nada.


BKJ (3) E disse Deus: Haja luz; e houve luz.

BKJ (4) E viu Deus a luz, que isto era bom; e Deus separou a luz das trevas.


Esses dois versos são de fato bastante incríveis. Observe a sequência: (1) Deus comanda a existência da luz, (2) Deus vê a luz após criada, (3) Deus se apercebe de que fez bem em criá-la, (4) Deus separa a luz das trevas. A Bíblia não está dizendo que Deus já tinha visto a luz em algum momento anterior, que já sabia quão boa era ela e que, de posse dessas informações, decidiu reproduzi-la novamente. Nem tampouco a Bíblia está afirmando que Deus já havia criado a luz em algum lugar antes, que já tinha bem firmado o conceito de luz e que, desse modo, já dispunha de um juízo de valor já bastante arraigado em relação à utilidade ou beleza dela.

Esses dois versos são testemunhas vivas de que Deus de fato CRIA A PARTIR DO NADA. Nem mesmo Deus poderia afirmar categoricamente quão boa a luz seria antes de criá-la, porque algo como a luz nunca antes tinha sido experimentado. Até o momento em que Deus dá o comando final para sua existência, nada nem ninguém tem uma ideia totalmente precisa do que é luz. O conceito, se existisse, era unicamente um esboço nos planos de Deus. Os versos deixam claro que há uma enorme diferença entre algo que é mero esboço nos planos de Deus e algo que Deus decretou existir. Quando Deus está criando, prostrem-se Suas criaturas, Ele está avançando com ímpeto para a fronteira do maravilhoso desconhecido. O desconhecido do homem apenas? Não. Ele está avançando para além do Seu próprio desconhecido. Ao criar, Deus pode incrementar aquilo que pensou anteriormente, e parece aqui fazê-lo. Ele pode de repente querer mais do que aquilo que já esboçou, na medida em que jamais se encontra na obrigatoriedade de se contentar com as “opções disponíveis”. Ele possui a prerrogativa de rever e aperfeiçoar até os limites ainda desconhecidos da perfeição, independentemente de estímulos externos. Deus pode ser tão mais maravilhoso e surpreendente quanto deseje ser e criar com tanto mais engenhosidade quanto deseje criar, a qualquer momento que lhe apeteça. Se os esboços de Deus são perfeitos, quão mais perfeitos ainda o são quando implementados após Seu comando criativo, que amplia a perfeição de Seus planos.

Ao longo do capítulo, em diversas ocasiões Deus declara ser bom algo que Ele está observando de primeira mão, logo após dar um passo para fora dos limites daquilo que já se conhece. Trata-se de Alguém criando livremente, testando os limites do conhecimento passado, avançando para as fascinantes fronteiras do novo e deleitando-se em avaliar o impacto benéfico recém-descoberto, em termos de beleza e utilidade. Logo no próximo verso, tudo isso fica ainda mais claro.


BKJ (5) E chamou Deus à luz Dia, e às trevas ele chamou Noite. E houve a tarde e a manhã, o primeiro dia.


Pergunto: em que momento se dá nome a algo? Se a luz já existisse de antemão, ela já teria um nome. Se a escuridão já existisse de antemão, ela já teria um nome. Coisas só recebem nomes quando passam a existir PELA PRIMEIRA VEZ. Eu não posso tomar uma chapa de alumínio, fazer nela uma concavidade, anexar a ela um cabo e anunciar por aí que à minha invenção darei o nome de panela. Nomes são dados às coisas EFETIVAMENTE NOVAS. Aliás, parece ser o caso que Deus nem mesmo antecipou nos Seus planos nomes para a luz e as trevas. Por ser a luz uma coisa tão inovadora e tão fronteiriça, considerando o que até então existia, capaz mesmo de resultados práticos muito surpreendentes, Deus parece ter tomado o cuidado de vê-la pronta antes de atribuir a ela um nome. Se a luz fosse algo com uma forma já definitiva nos planos de Deus, antes de ser trazida à realidade ela já teria um nome, mas algo esboçado ainda não é exatamente algo e, embora um esboço possa conter em si também o esboço de um nome, certamente não é digno de um nome definitivo, tal como é aquilo que de fato passou a existir. A criação divina não é apenas uma réplica ou contrapartida exata de algum plano imemorial de Deus, razão pela qual a coisa criada merece um nome que lhe seja próprio. Em cada ato criativo, Deus coloca tanto mais amor e engenhosidade quanto o queira, acrescentando nova perfeição à antiga, se assim entender que deve. Por que então deveria Ele, ao empreender tão laborioso trabalho, contentar-se com qualquer nome provisório que ainda não capturava toda a dimensão, beleza e esplendor do objeto criado? A maneira formidável e surpreendente com que Deus traz vida aos Seus próprios planos justifica a adoção de novos e definitivos nomes para as coisas recém criadas.

O ato de dar nomes se repete em Gênesis 2:19 e, nessa oportunidade, a situação é ainda mais surpreendente: Deus convoca Adão para dar nomes aos animais recém-criados. É simplesmente fantástico pensar a respeito: se os animais tivessem sido antevistos por Deus em todos seus detalhes e de modo completo, eles já teriam nomes. Como Deus poderia pedir a Adão para ele dar nomes a animais que já eram conhecidos de antemão em sua plenitude e, portanto, já possuíam nomes? Não estaria aqui a Bíblia errada? Não seria o caso de que Deus já conhecia os nomes de todos os animais e os comunicou a Adão? Absolutamente, não foi assim que ocorreu. Deus pediu a Adão para dar nomes aos animais porque nada similar a eles havia antes sido observado ou antecipado em sua totalidade, nem por criaturas e nem pelo próprio Deus. Deus ainda não tinha nomes para os animais porque eles eram elementos completamente novos em Sua criação. Mesmo que Deus os houvesse antes concebido intelectualmente, a construção final era diferente mesmo da Sua mais vívida ideia anterior a respeito deles, e portanto mereciam nomes diferentes daqueles que Deus pudesse ter pensado de antemão. Mesmo para Deus, a implementação parece ser sempre diferente do projeto, pois no processo criativo há liberdade. Deus coloca em Sua criação mais do que aquilo que simplesmente pensou. Lembro-me de quando saí para buscar minha cachorra em uma ONG de resgate de animais. Eu até tinha em mente alguns nomes, mas eu não a havia visto. Eu fui até lá disposto a levar para casa um cachorro, mas não tinha visto nenhuma foto. Foi apenas após escolhê-la, assinar os papéis, colocá-la no carro e olhar bem para o curioso animal que pude dar a ela um nome apropriado.

Vamos lembrar ainda do que disse Peckam: “Deus, em Sua sabedoria perfeita, que leva em conta todos os fatores e todas as opções disponíveis...” Pobre de Deus se Sua sabedoria perfeita fosse a que Peckam atribui a Ele. A noção de perfeição platônica é na realidade uma horrorosa e frágil imperfeição. Ao se ver prestes a criar a luz, Deus estava restrito a determinadas opções? Era a luz uma “opção” em meio a um leque finito de “opções”? Peckam poderia retrucar que as “opções” de Deus são os esboços em Sua mente. Eu responderia: se for o caso, alguma coisa é capaz de restringir a quantidade de planos variados que Deus é capaz de esboçar? Não é Ele capaz de muito mais do que infinitos planos? Não possui Deus a prerrogativa de avançar para além de Seus próprios esboços e elaborar algo completamente novo? Se Deus, prestes a criar a luz, entendesse que nem a luz e nem qualquer outra coisa que Ele esboçou de antemão atenderia a Seus desígnios ou vontades, não seria Ele capaz de reconsiderar a criação da luz e esboçar e criar algo ainda mais maravilhoso? Deus não está sujeito a um universo limitado de “opções”, pois é capaz de criar, em tempo real e no mesmo instante que desejar, quantas novas “opções” entender necessárias. Ele sempre possui e possuirá mais do que infinitas propostas criativas EX NIHILO (a partir do nada) para cada circunstância dada.

Peckam também poderia retrucar: as “opções” de Deus são as limitações impostas por Sua própria criação composta por seres livres. Eu responderia: Deus tem infinitas formas de abordar mesmo o pecado. Não há nenhuma evidência de que o mal impõe restrições ao poder criativo de Deus. Mesmo diante do pecado, e especialmente diante dEle, Deus pode aparecer a qualquer instante com infinitas novas “opções” criadas a partir do nada, como de fato o faz. Aliás, não é justamente esse poder criativo de Deus que sustenta a luta contra o mal? Não fosse a capacidade de Deus de fazer frente ao mal com imensa criatividade, já teríamos sido devorados pelas fronteiras cada vez mais alargadas das novidades malignas. Esse ponto será retomado um pouco mais adiante, quando considerarmos a herança criativa que Deus legou a algumas de suas criaturas, incluso o próprio Anticristo.

Peckam ainda afirmou: “Deus sempre faz o que é melhor, levando em conta os meios a Ele disponíveis”. Como demonstra o verso 5 de Gênesis 1, Deus não dispõe de “meios” para exercer poder criativo. Ele dispõe do poder de comando para que algo exista, o que inclui não apenas meios disponíveis em dado recorte de tempo, mas possibilidades ilimitadas de suplantar os meios disponíveis e superá-los, até os intocáveis limites do que ainda há por criar. Com a existência do pecado que é exercido mediante plena liberdade, Deus pode até se ver diante de um homem ou mulher que se recuse livremente a permitir Seu comando para que seja feito ou preservado santo. Isso entretanto não quer dizer que Deus perde Sua capacidade criativa para lidar com o problema. Justo o contrário: é por não dispor das vias autocráticas, pelas quais nem mesmo tem apreço, que Deus se lança sem medo nas fronteiras inatingíveis do que ainda não foi tentado, a procurar por soluções criativas e autênticas na luta contra o mal. Ele não tem à Sua disposição apenas um estoque de finitas opções disponíveis para lidar com o problema, mas a possibilidade de levantar do zero esse mesmo tanto de infinitas novas opções ou abordagens. Se Deus não pode dar um comando direto EX NIHILO para santificar uma pessoa que deixou claro que deseja ser imune a esse poder de comando, isso antes O instigará à criatividade do que O impedirá de exercê-la.

Deus criou seres inteligentes com essa espécie de poder de veto e, até onde temos evidência, não parece nenhum pouco disposto a retirar deles tal poder. Ele parece antes disposto e insaciavelmente compelido a contornar essa disposição de coisas justamente valendo-se de Seu infinito poder criativo para suscitar novas, inesperadas e surpreendentes alternativas.

A última parte do verso cinco se refere ao encerramento de um ciclo temporal. O homem não estava lá ainda, mas o tempo já existia. Não se trata, portanto, de uma ilusão humana. Naquele momento, havia apenas Deus para perceber o tempo. Deus trabalha em atos sucessivos e os percebe dessa forma, de tal modo que compreende muito bem o que vem a ser a passagem do tempo. Os teólogos em geral dirão que Moisés não sabia exatamente o que estava escrevendo ou que ele estava sendo poético. No primeiro caso, se Moisés não possuía suficiente entendimento a respeito do assunto, isso tornaria o texto ainda mais literal, pois seria o relato direto de Deus a respeito de Si mesmo, sem intermediários humanos, e apenas uma mente doentia seria capaz de propor que Deus mente a respeito de Si próprio. Se Moisés estava sendo poético, é evidente que isso não sobrepõe a inspiração divina. Ele não pode ser poético EM DETRIMENTO do que Deus quer dizer. Se Deus fosse atemporal, Moisés não poderia apresentar poeticamente um Deus temporal, que é exatamente o Deus exposto em Gênesis 1. Deus experimenta em tempo real a sucessão de acontecimentos e Moisés escancara isso de modo explícito, quer seja pelo estilo literário da crônica quer pelo da poesia. Não haveria recursos estilísticos para o autor utilizar se a ideia fosse apresentar um Deus atemporal? Como uma poesia apresentando um Deus que age ao longo do tempo de alguma forma poderia ser um recurso de linguagem para apresentar um Deus atemporal? Se a ideia em Gênesis 1 fosse apresentar um Deus atemporal, certamente isso seria possível no hebraico, tanto por meio de afirmações categóricas quanto por intermédio de alegorias ou parábolas. E insisto: mesmo se tratássemos Gênesis 1 como uma parábola, tratar-se-ia de uma parábola a respeito de qualquer coisa menos atemporalidade de Deus.


BKJ (6) E disse Deus: Haja um firmamento no meio das águas, e deixe que separe as águas das águas.

BKJ (7) E fez Deus o firmamento, e separou as águas que estavam debaixo do firmamento das águas que estavam acima do firmamento. E assim foi.

BKJ (8) E Deus chamou ao firmamento Céu. E houve a tarde e a manhã, o segundo dia.


O segundo dia é um ciclo criativo idêntico ao primeiro: comando criativo A PARTIR DO NADA, o surgimento daquilo que Deus mandou existir e um nome para a invenção completamente inédita, culminando com o encerramento de uma unidade de tempo. A recorrência de um mesmo padrão criativo deveria nos dizer algo: Deus está insistindo em nos mostrar como Ele cria.


BKJ (9) E disse Deus: Deixe as águas sob o céu em um lugar, e apareça o solo seco. E assim foi.

BKJ (10) E chamou Deus ao solo seco de Terra; e ao ajuntamento das águas ele chamou Mares. E Deus viu que isto era bom.

BKJ (11) E disse Deus: Deixe a terra trazer a relva, a erva produzindo semente, e a árvore frutífera produzindo fruto segundo a sua espécie; cuja semente esteja em si mesma, sobre a terra. E assim foi.

BKJ (12) E a terra produziu a relva, e a erva que dava semente segundo a sua espécie, e a árvore frutífera, cuja semente estava nela, segundo a sua espécie. E Deus viu que isto era bom.

BKJ (13) E houve a tarde e a manhã, o terceiro dia.


Mais comandos criativos partindo do nada, mais nomes para invenções recém-criadas, novas expressões de satisfação de Deus ao ver em funcionamento coisas novas, belas e úteis e o encerramento de um período de tempo. Se Deus soubesse de antemão qual seria Sua própria reação futura, de fato Ele não experimentaria a alegria de ver que algo que Ele pioneiramente trouxe à existência se provou ser maravilhoso. A recorrência do padrão criativo é evidência gritante.


BKJ (14) E disse Deus: Haja luzes no firmamento do céu para dividir o dia da noite; e que sejam por sinais, e para estações, e para dias, e anos;

BKJ (15) e que eles sejam por luzes no firmamento do céu para dar luz sobre a terra. E assim foi.

BKJ (16) E fez Deus duas grandes luzes; a luz maior para governar o dia, e a luz menor para governar a noite; ele também fez as estrelas.

BKJ (17) E Deus os colocou no firmamento do céu para dar luz sobre a terra;

BKJ (18) e para governar sobre o dia e sobre a noite, e para separar a luz das trevas, e Deus viu que isto era bom.

BKJ (19) E houve a tarde e a manhã, o quarto dia.


Quarta recorrência.


BKJ (20) E disse Deus: Produzam as águas abundantemente criaturas viventes que se movem, e aves que possam voar acima da terra, no vasto firmamento do céu.

BKJ (21) E Deus criou grandes baleias, e toda criatura vivente que se move, que as águas produziram abundantemente, segundo a sua espécie, e toda ave alada segundo a sua espécie; e Deus viu que isto era bom.

BKJ (22) E Deus os abençoou, dizendo: Sede frutíferos e multiplicai-vos, e enchei as águas nos mares, e multipliquem-se as aves sobre a terra.

BKJ (23) E houve a tarde e a manhã, o quinto dia.


Quinta recorrência.


BKJ (24) E disse Deus: Produza a terra criaturas viventes segundo as suas espécies, gado, e seres rastejantes, e animais da terra segundo a sua espécie. E assim foi.

BKJ (25) E fez Deus os animais da terra segundo a sua espécie, e o gado segundo a sua espécie e tudo que rasteja sobre a terra segundo a sua espécie; e Deus viu que isto era bom.

BKJ (26) E disse Deus: Façamos um homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e que eles tenham domínio sobre os peixes do mar, e sobre as aves do céu, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre toda a coisa rastejante que rasteja sobre a terra.

BKJ (27) Assim Deus criou o homem a sua própria imagem, à imagem de Deus o criou; macho e fêmea ele os criou.


As características de Deus apresentadas ao longo do capítulo nos dão dicas muito boas do que vem a ser uma criatura feita à imagem e semelhança dEle. Relembremos: Deus possui liberdade criativa de esboçar e trazer à existência coisas completamente novas; Ele distingue aquilo que é bom daquilo que não é; Ele se maravilha e se surpreende diante do novo, do que se entende que possui emoções. Alguém feito à imagem e semelhança de Deus herda dEle tais características.

A fim de que não haja dúvidas a respeito da semelhança entre Deus e os seres humanos, lembremos das palavras do próprio Jesus em João 10:34-36:


“Não está escrito na vossa lei: Eu disse: Vós sois deuses? Se ele os chamou de deuses a quem veio a palavra de Deus, e a escritura não pode ser anulada, àquele a quem o Pai santificou, e enviou ao mundo, dizeis vós: Tu blasfemas, porque eu disse: Eu sou filho de Deus?”


O que Jesus está dizendo senão que mesmo o homem comum que recebeu a palavra de Deus é muito semelhante a Deus, a tal ponto que a Bíblia o chama de deus, com “d” minúsculo? Jesus está respondendo aos judeus: “por qual motivo vocês se escandalizam quando eu afirmo ser filho de Deus, se, de posse da palavra dEle, cada um de vocês pode fazer uma afirmação semelhante a respeito de si?”. Essa passagem demonstra, entre outras coisas, a que ponto os líderes da nação judaica e o povo judeu como um todo estavam helenizados a essa altura. Tão perdida estava a mente dos judeus em meio à filosofia grega, que Jesus precisava recorrentemente evocar diante deles a Lei e os Profetas. Com grande luta, esforçava-se por explicar que o Deus de Gênesis não é o deus das formas, de Platão. Lembremos que para esse filósofo grego que tanto influenciou o mundo, Deus é tão absolutamente transcendente, que é impossível que algo no nosso mundo tenha qualquer semelhança com Ele, por menor que seja. Nessa perspectiva, afirmar que alguém é filho de Deus é o mais puro absurdo. Quão árdua tarefa Jesus tinha diante de Si ao propor que as pessoas esquecessem Platão e se voltassem para os textos inspirados! É sabido que os fariseus inclusive criam na imortalidade da alma, clássico ensino platônico que era obviamente contrário ao relato bíblico.

Podemos ainda avaliar de que lado da questão estava Ellen G. White:


"Man was the crowning act of the creation of God, made in the image of God, and designed to be a counterpart of God...Man is very dear to God, because he was formed in His own image."

Ms 45,1895, part.18


"God created man a superior being; he alone is formed in the image of God, and is capable of partaking of the divine nature, of co-operating with his Creator and executing his plans; and he alone is found at war with God's purposes."

The Review and Herald, April 21, 1885, part.4


"He has given us powers, that, to a certain extent, are similar to those which he himself possesses; and we should labor earnestly to develop these powers, not to please and exalt self, but to glorify him."

The Review and Herald, April 21, 1885, part.1


No primeiro trecho, afirma-se que homem foi projetado para ser uma contrapartida de Deus, ao passo que no segundo está sendo dito que o homem “é capaz de participar da natureza divina”. O terceiro trecho arremata: “possuímos poderes que, até certo ponto, são SIMILARES ao que o próprio Deus possui”.

O que poderia significar então a afirmação de que os homens que recebem a Palavra de Deus, como Jesus declara, são deuses? E o que Ellen White está dizendo ao afirmar que o homem, criado como contrapartida de Deus, é capaz de participar da natureza divina e possui poderes que até certo ponto são similares aos poderes que o próprio Deus possui? Tudo isso significa que Gênesis 1:27 é incontestavelmente literal e que aquilo que o próprio Deus realizou entre os versos 1 e 26 é dado ao homem fazer em menor medida. Blasfemo? Tanto quanto blasfemaram Ellen G. White e Jesus.

Que fez Deus entre os versos 1 e 26 de Gênesis 1? (1) criou coisas completamente inéditas, a partir do nada; (2) fez um juízo a respeito da beleza e utilidade dessas coisas; (3) maravilhou-se; (4) deu nomes às Suas invenções.

A respeito da herança que nos foi dada por Deus para criar coisas inéditas a partir do nada, basta que olhemos para a história humana. Há uma grande doutrina, chamada materialismo histórico, que prega que o homem nada mais é que aquilo que a estrutura à sua volta o faz ser, que o acorrenta e o obriga a ser aquilo que inevitavelmente será. Não há no homem, segundo essa doutrina, a possibilidade de avançar para algo efetivamente inédito e trilhar o caminho desconhecido de um futuro aberto, ainda por ser construído. Tal doutrina não poderia ter se mostrado mais errada: ao ser utilizada como fundamento do marxismo no século XIX, justificou a incorreta profecia de que o ser humano, em geral e de modo inevitável, aderiria a uma forma específica de socialismo, que se seguiria à forma de produção capitalista. Os erros foram generalizados: (1) o ser humano não aderiu de forma geral ao socialismo; (2) nas situações em que houve adesão ao socialismo, mesmo aí foram experimentadas formas muito variadas dessa doutrina, e não apenas uma em específico; (3) o caso mais emblemático de socialismo, o soviético, nem mesmo sucedeu uma condição capitalista anterior, mas antes emergiu diretamente de uma sociedade agrária com aspectos medievais. Os marxistas, que defendem a racionalidade, deveriam ter aprendido algo com os recorrentes erros dos protestantes que tanto condenam (às vezes com razão), os quais costumam propor profecias que apontam para ações humanas futuras de modo incondicional.

Da mesma forma com que Deus cria o futuro de forma completamente livre, assim o faz o ser humano, sempre que preservada a liberdade que lhe foi originalmente concedida. O ser humano ter sido criado semelhante a Deus e não idêntico a Ele significa apenas que a escala e o escopo da nossa liberdade não atinge as dimensões da liberdade divina, o que certamente não é necessário demonstrar. Conforme o próprio Deus nos revelou por meio de Ellen White, os poderes que possuímos são ATÉ CERTO PONTO semelhantes aos dEle. O tamanho e alcance das criações e intervenções divinas na história não podem ser igualadas pelo homem, mas dentro da nossa alçada e da nossa pequena área de atuação e influência, criamos à partir do nada, trazemos à existência coisas e situações completamente inéditas e adentramos em um futuro ainda por ser construído, valendo-nos dos poderes que nosso Criador nos outorgou na semana inicial.

Gênesis 1:27 quer dizer que Deus nos concedeu livre arbítrio? Sim, mas seguramente quer dizer ainda mais. Na parte 1 do presente texto, propus uma diferença entre liberdade criativa e livre arbítrio, que aqui nos será útil. Lembremos: entendo que a liberdade é a capacidade para criar ou suscitar coisas completamente novas e escolher aquilo que ainda não existe, ultrapassando o que já existe. O livre arbítrio, por sua vez, entendo que é o poder de escolha entre opções já dadas. Em outras palavras, podemos simplificar e dizer que o livre arbítrio consiste na livre escolha moral entre o bem e o mal. Considero liberdade e livre arbítrio coisas diferentes porque existe um sem- número de inimagináveis formas ainda não inventadas de praticar o bem, as quais nem mesmo a eternidade será capaz de esgotar. Em revelação à respeito da condição de Adão e Eva no Éden incontaminado, Ellen White escreve:


“A ordem e harmonia da criação falavam-lhes de sabedoria e poder infinitos. Estavam sempre a descobrir alguma atração que lhes enchia o coração de mais profundo amor, e provocava novas expressões de gratidão. Enquanto permanecessem fiéis à lei divina, sua capacidade para saber, vivenciar e amar, cresceria continuamente. Estariam constantemente a adquirir novos tesouros de saber, a descobrir novas fontes de felicidade, e a obter concepções cada vez mais claras do incomensurável, infalível amor de Deus.”

Patriarcas e Profetas, p. 23


De modo semelhante, até o momento temos visto que Satanás, os anjos e os homens que com ele pactuam também encontram formas inventivas de praticar o mal. A diferença entre um caso e outro é que a prática do bem realmente nunca se esgota, ao passo que a prática do mal, embora PAREÇA conduzir a uma expansiva e infinita liberdade, em realidade chega a um beco sem saída em dado momento. Ao contrário do ocorre na obediência à Deus, o mal sempre desemboca em uma situação limite: tédio, apatia, insanidade, irracionalidade, doença, morte etc. Com isso quero dizer que o mau uso do livre arbítrio pode conduzir à perda da liberdade criativa concedida no Éden, que é um dos elementos que constituem nossa semelhança com Deus.

Quando nossa expansão criativa e inovadora por meio dos fatos se mostra contrária à Lei de Deus, a realidade do livre arbítrio se coloca diante de nós e uma escolha moral se torna inevitável. Assim como Deus avalia a criação da luz e em seguida a declara ser boa, temos a oportunidade de olhar para nossas investidas criativas e declará-las boas ou más. Deus não nos deixou reféns de um ímpeto criativo descontrolado e irrefletido. Novamente temos a imagem e semelhança de Deus contando a nosso favor. O capítulo 1 de Patriarcas e Profetas é particularmente emblemático a respeito disso. Satanás, dotado de uma capacidade criativa semelhante à do homem, havia avançado para os limites do desconhecido, a partir dos poderes que o próprio Deus lhe havia concedido, mas esse caminho até então inexplorado o conduzia aos poucos à desobediência e “em seu coração havia um conflito estranho”. Ellen White afirma que “o próprio Lucifer não estivera a princípio ciente da natureza verdadeira de seus sentimentos” e que os fatos a respeito de seu pequeno avanço criativo foram colocados diante dele, na medida em que “esforços foram feitos para convencê-lo de seu erro (…), e fez-se-lhe ver qual seria o resultado de persistir em revolta.”. O relato do capítulo 1 de Patriarcas e Profetas revela que Deus não inibe os atos criativos dos Seus seres inteligentes, pois seria o mesmo que negar a eles a essência divina. O livre arbítrio, que opera em conjunto com a razão e a capacidade para compreender a realidade dos fatos, parece ter sido colocado diante de Satanás, tal como é colocado diante de nós, como uma espécie de freio moral para a liberdade inventiva mal direcionada. Isso é efetivamente necessário, pois a liberdade criativa direcionada à desobediência é simplesmente insustentável. Deus nos fez como Ele e, a cada passo criativo que damos, temos a chance de parar para observar o que fizemos e avaliar se foi mesmo bom. Isso, vale dizer, é muito diferente de afirmar que devemos estacar onde a realidade nos coloca e preferir a retração à expansão, por conta do medo de falhar. Gênesis 1 nos promete que Deus não nos abandonará ao nos decidirmos por avançar para onde ainda não se avançou. Ao exercer nossa liberdade, temos confiança de que o Espírito de Deus nos auxilia na tarefa de fazer bom uso do livre arbítrio, quando paramos para avaliar se aquilo que criamos foi efetivamente bom. Como alerta a Sra. White, o medo de avançar para o novo não deve nos tornar conservadores:


“Whenever the people of God are growing in grace, they will be constantly obtaining a clearer understanding of His word. They will discern new light and beauty in its sacred truths. This has been true in the history of the church in all ages, and thus it will continue to the end. But as real spiritual life declines, it has ever been the tendency to cease to advance in the knowledge of the truth. Men rest satisfied with the light already received from God's word, and discourage any further investigation of the Scriptures. They become conservative, and seek to avoid discussion.” CW 39


Portanto, não somos meros possuidores de livre arbítrio e não se trata de que temos diante de nós APENAS a escolha entre o bem e o mal. De fato, todas nossas escolhas e ações caem em uma dessas duas categorias: as boas e as más. Entretanto, Deus nos dotou de uma capacidade inventiva para criar situações novas. Em cada um dos nossos dias escrevemos junto com Deus um dia completamente novo na história do universo. O futuro não existe até que Deus e Suas criaturas livres, a quem delegou coparticipação nos rumos da existência, o criem. Como a semelhança entre Deus e nós vai “até certo ponto”, arrisco-me a dizer que Deus cria “futurões” enquanto criamos “futurinhos”.


BKJ (28) E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Sede frutíferos e multiplicai-vos, e reabasteça a terra e subjugai-a; e tende domínio sobre os peixes do mar, e sobre as aves do céu, e sobre toda a coisa vivente que se move sobre a terra.

BKJ (29) E disse Deus: Eis que vos tenho dado toda erva que dá semente, que está sobre a face de toda a terra, e toda árvore na qual está o fruto de uma árvore que produz semente; para vós será para alimento.

BKJ (30) E a todo animal da terra, e a toda ave do céu, e a cada coisa que rasteja sobre a terra, em que há vida, eu tenho dado toda erva verde para alimento. E assim foi.

BKJ (31) E Deus viu todas as coisas que ele havia feito; e eis que era muito bom. E houve a tarde e a manhã, o sexto dia.


O último verso do capítulo traz uma nova revelação. O autor inspirado fez questão de frisar que Deus enxerga níveis diferentes de beleza e utilidade, ao distinguir um “viu que era muito bom” dos anteriores “viu que era bom”. Ou seja, Deus não apenas efetuou vários atos criativos com efeitos surpreendentes cuja beleza e utilidade precisavam ser confirmados a posteriori. A combinação desses vários atos criativos isolados precisava ainda ser avaliada em seu conjunto. E esse conjunto estava no mais distante dos intocáveis limites do surpreendente e novo.

O mesmo argumento foi repetido seis vezes: Deus é livre para criar a partir do nada, nas fronteiras do que ainda não existe, experimenta sucessões de acontecimentos, conectado ao tempo, sente emoções e Se maravilha. Como se não fosse o suficiente, a Bíblia ainda arremata: nada disso é “antropomorfismo”, pois antes de existir o homem, Deus já era assim. Não se trata de que estamos reduzindo Deus a um homem ao afirmar que Ele possui todas essas características. ELE É QUEM ORIGINALMENTE AS POSSUI e DELE nós as herdamos.

Satanás tem logrado com surpreendente êxito levar pessoas zelosas a encarar como a blasfêmia do século a afirmação de que o homem se assemelha a Deus. Ele as torna exaltadas em seu zelo e as leva a perguntas retóricas inflamadas a respeito da presunção do homem de querer entender Deus ou de aplicar a Ele quaisquer tipos de raciocínios ou pensamentos humanos, mas Gênesis 1 nada mais é que Deus gritando e implorando para ser entendido por homens. Satanás cita as escrituras, afirmando que “Deus não é como os homens” (Núm. 23:19), querendo com isso dizer que não há semelhança entre Um e outro, porém podemos prontamente respondê-lo com um está escrito: “disse Deus: Façamos um homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”. De fato, não é Deus que é como os homens, mas os homens é que foram criados semelhantes a Ele. A semelhança ainda existe e Satanás seguramente não gosta que isso seja lembrado e trazido à tona.

O poder criativo intrínseco, a capacidade para descobrir o novo e o surpreendente, a alegria de ver a realidade mudada para melhor por meio de novos e inventivos expedientes, a liberdade bem usada e os saudáveis sentimentos e afeições nos lembram de nossa ancestralidade: nosso Pai já possuía tudo isso. E deveríamos estar suficientemente convencidos de que é somente na obediência e justiça de Cristo que recuperamos plenamente os maravilhosos atributos que Ele nos transmitiu ao nos criar.

A insistência no argumento de Gênesis 1 deveria nos dizer alguma coisa, mas no momento ainda não o faz. É como bater contra a muralha da filosofia grega, que deixou seu funesto legado de um Deus disforme e atemporal, do qual mesmo homens santos não puderam se desvencilhar. Temos, entretanto, a segurança de que Deus ainda age da mesma forma que agiu na semana da Criação. Ele possui uma incrível inventividade que chega até as fronteiras do inexplorado. Por meio dela, Deus parece estar reagindo e dando poderosos golpes na muralha das mentiras proferidas contra Seu caráter. A guerra está mais viva do que nunca antes esteve, desde que Satanás levantou homens como Platão e Agostinho. Tenho confiança de que o primeiro capítulo da Bíblia será lembrado e não mais passará batido como uma inútil poesia.


PARTE 6 – A LIBERDADE DE DEUS E A MENSAGEM DO SÁBADO


O adventista, muito mais do que os outros protestantes, foi quem realmente perdeu ao aderir ao calvinismo e ao arminianismo tradicionais. Quem de fato caiu em uma armadilha e não o percebeu foi o adventista. Ao professar crer em um Deus atemporal e provido de onisciência nos termos agostinianos, ele coloca em um banhado os alicerces de sua fé.

Desde criança, fui ensinado a carregar comigo a melhor apologética para o sábado. Entre parentes incrédulos, por exemplo, eu deveria estar atento para responder de pronto às tradicionais alegações contrárias ao sétimo dia como dia de guarda. Se alguém levantasse a ideia de que o sábado era para os judeus, de imediato eu deveria retrucar, com inteira confiança, que o sábado é muito anterior ao povo judeu e foi instituído no dia sete da Criação. De fato, o adventista precisará perceber que apegar-se ao relato literal da criação de Deus, com todas suas implicações, é sua única alternativa.

Lembremos então dos primeiros três versos de Gênesis 2 e façamos a respectiva tradução da versão King James para a fictícia (mas nem tanto) Bíblia na Versão Verdadeira:


BKJ (1) Assim os céus e a terra foram finalizados, e todo o seu exército.

NVV (1) Desde o princípio os céus e a terra foram finalizados. Tudo que há na terra e céus de uma só vez Deus decretou existir.


BKJ (2) E no sétimo dia Deus terminou o trabalho que havia realizado; e ele descansou no sétimo dia de todo o trabalho que havia feito.

NVV (2) E no sétimo dia nada aconteceu, pois Deus não experimenta dias. Ele não descansou especificamente nesse dia e nem em nenhum outro, pois Deus na verdade fez tudo de uma só vez e portanto trabalhou de uma vez por todas em um único momento, de tal modo que está desde então em um eterno descanso.


BKJ (3) E Deus abençoou o sétimo dia, e o santificou, porque nele ele havia descansado de todo o seu trabalho que Deus criou e fez.

NVV (3) Deus não santificou o sábado, primeiro porque para Deus o sábado não existe, assim como qualquer outro dia. Esse dia é apenas uma ilusão temporal na cabeça do homem. Em segundo lugar, Deus não se cansa, porque não trabalha (quem faz isso é o homem). Em terceiro lugar, Deus não cria ao longo do tempo. Gênesis 1 é apenas uma poesia com qualquer significado vago ou sem importância.


É um tanto evidente porque Lutero e Calvino não chegaram nem perto da verdade do sábado: para eles, Gênesis 1 jamais poderia ser literal. O protestantismo em geral herdou deles esse paradoxal afastamento da Sola Scriptura. Eles estão desculpados, mas nós não. Se o fundamento do sábado é o ato criador de Deus e esse ato não envolve a passagem do tempo, por que um dia específico da semana seria de fato santo? O que santifica o sábado é o DESCANSO DE DEUS EM UM DIA ESPECÍFICO e não o descanso do homem. Se a afirmação de que Deus descansou no sábado é simbólica, também o será a afirmação de Êxodo 20:10 e 11, que na tradução NVV seria mais ou menos assim:


BKJ (10) mas o sétimo dia é o shabat do SENHOR teu Deus, nele não farás obra alguma, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu servo, nem tua serva, nem teu gado, nem teu estrangeiro que está dentro das tuas portas,

NVV (11) mas o sétimo dia é o shabat do HOMEM, pois é o homem que experimenta dias. Até não farás obra alguma nele, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu servo, nem tua serva, nem teu gado, nem teu estrangeiro que está dentro das tuas portas, MAS NÃO PORQUE ISSO TEM QUALQUER COISA QUE VER COM DEUS.


BKJ (11) pois em seis dias o SENHOR fez os céus e a terra, o mar e tudo que neles há, e descansou no sétimo dia. Portanto, o SENHOR abençoou o dia do shabat e o santificou.

NVV (11) pois o Senhor fez tudo de uma só vez e não em etapas temporais, e Ele não descansou em nenhum dia, pois não conhece dias e nunca trabalhou para que precisasse descansar. Deus trabalhar é um antropomorfismo.


Mas piora e muito. Para o adventista, o sábado não é apenas o dia de guarda estabelecido na criação que ainda precisa ser observado. A missão adventista representada na pregação das três mensagens angélicas é uma clara referência à semana literal da criação. Conforme lemos em Ap. 14:7:


“dizendo em alta voz: Temei a Deus, e dai-lhe glória; porque é chegada a hora do seu juízo. E adorai aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas.”


Além dessa referência direta a Gênesis 1, sabemos que a guarda do sábado contida na Lei de Deus é um distintivo do povo santo ao qual Ap. 14:12 faz referência:


“Aqui está a paciência dos santos; aqui estão aqueles que guardam os mandamentos de Deus e a fé de Jesus.”


Reflitamos na seguinte passagem de EGW:


“O verdadeiro sábado tem que ser restituído à sua legítima condição de divino dia de repouso.”

TS3 - Pag. 19


Como poderia o sábado ser divino se Deus não o experimenta? Como é possível crer que o sábado é um decreto eterno que será observado por toda a eternidade se Deus não o guarda e nem mesmo é capaz de fazê-lo?

Alguns adventistas responderão que seguramente Deus ainda experimenta o sábado e nele descansa, como fez no passado. Porém, ao mesmo tempo em que professam crer que Deus o faz, defendem que Ele havia antevisto desde a eternidade a semana da criação e portanto ela já existia para Ele em Seu eterno agora. É necessário entender que, se a semana da criação não envolve ETAPAS CRIATIVAS LEGITIMAMENTE PIONEIRAS, implementadas a partir do nada e não de antemão fixadas por onisciência exaustiva, o sábado está morto.

Cabe aqui remoer essa questão quantas vezes forem necessárias: a mensagem do sábado, cerne das três mensagens angélicas, consiste em que Deus descansou no sábado. De que? Daquilo que Ele já havia criado ou previsto desde a eternidade ou daquilo que criou A PARTIR DO NADA? Se Ele não experimentou nenhum trabalho criativo genuíno, EX NIHILO, na semana da nossa fundação, mas somente viu finalmente acontecer aquilo que, em sua completude, já estava previsto desde a eternidade, parece ter sido o caso de que Deus, na semana da criação, apenas seguiu o passo a passo de montagem do mundo que já estava no manual que Ele havia preparado com infinita antecedência.

Esse manual tão fidedigno era, conforme estabelece a crença da onisciência arminiana que tomou a fé adventista, que entre ele e o objeto final já montado nenhuma diferença pode existir, pois aquilo que Deus enxerga de antemão é exatamente aquilo vem a acontecer. Neste caso, entretanto, a riqueza de Gênesis 1 desaparece: não há como Deus se maravilhar com a criação de algo que, na verdade, já estava plenamente criado, ou dar nomes a coisas que, desde muito tempo antes, já tinham sua forma completa e já possuíam seus definitivos nomes. O relato da onisciência calvinista e arminiana apresenta Deus criando ou observando de infinita antemão, desde a eternidade, cada detalhe da criação da terra. A alegria sentida diante da invenção Deus já a sentia, portanto, desde a eternidade. Os nomes atribuídos a essas novidades também já eram por Deus conhecidos. Todo o trabalho genuíno, nesse caso, foi o de dar um único comando criativo, na versão calvinista, ou uma única espiada no futuro, no caso arminiano. Se Deus já tinha todos os detalhes criativos prontos e todos os nomes já estabelecidos, a tal ponto que seria impossível discernir qualquer diferença entre a terra projetada de antemão por Deus por meio de Sua onisciência e a terra que de fato veio a ser criada, não há criação a partir do nada, não há alegria de ver que algo trazido à realidade é bom e não há motivos para pensar em nomes apropriados para criações efetivamente novas. Se o sétimo dia não representa uma literal interrupção de um exaustivo trabalho criativo não menos literal, não há do que Deus descansar e portanto não há nenhuma benção para conceder ou mandamento para instaurar. Sendo difícil afirmar que Deus descansou de um trabalho criativo de fato bastante desafiador, nas fronteiras do novo e do desconhecido, também será muito difícil afirmar que o sábado possui algum valor. Nesse caso, a celebração do sábado, se é que ela deve ocorrer, deve ser bastante comedida. Ela não tem um significado tão forte quanto os adventistas alardeiam. Quando Deus olha a história e enxerga tudo como o eterno agora, Ele é incapaz de enxergar sábados.

Pensemos um pouco mais a respeito: se, em realidade, o trabalho de Deus na criação foi cabalmente executado no momento em que Ele olhou adiante no futuro e viu cada detalhe efetivamente pronto e colocado em seu devido lugar, Deus não trabalhou absolutamente nada nos dias anteriores ao sábado e portanto a benção que sobre esse dia repousa é espúria. Se Deus habita no eterno agora, como Agostinho postulou e os protestantes aceitaram, o “descanso” que Deus gozou no sábado é uma figura de linguagem cujo significado ninguém pode realmente compreender. Da mesma forma, a benção concedida a esse dia também é uma figura de linguagem que pode significar qualquer coisa. O mesmo vale para o decálogo e para Apocalipse 14. Assim o adventista, sem o perceber, pisoteia sua mais valorizada crença, fundamento de sua fé.

Portanto, a semana da criação, para a fé adventista, precisa ser uma sequência de atos criativos genuínos e delimitados no tempo, os quais necessitam ser momentos únicos na própria experiência de Deus. “Em seis dias o Senhor fez o céu, a terra, o mar e tudo que neles há” precisa significar que foram em seis dias que Deus de fato fez tudo isso. Precisamos crer que, durante esses seis dias, Ele estava decididamente empenhado em uma missão criativa atual, real e espontânea, até as vísceras de Sua própria alma.


CONCLUSÃO


Logo na sua primeira página, a Bíblia trata de deixar bem claro quem é o Deus que protagonizará as histórias contadas nas centenas de páginas que se seguirão. Esse Deus, fica suficientemente demonstrado, não dá qualquer espaço para aquele que Platão inventou, Agostinho cristianizou e a Reforma Protestante popularizou.

Gênesis 1 escancara o caráter de Deus e a liberdade criativa de que Ele goza. Ele cria a partir de absolutamente nada, por meio de sucessivos comandos independentes uns dos outros e sujeitos apenas à Sua deliberada resolução de executá-los. A rica sucessão de acontecimentos independentes, que envolve comandos criativos, observações, avaliações e atribuições de nomes, descarta qualquer indício de atemporalidade, ainda que o relato fosse considerado poético.

Junto com a atemporalidade, a onisciência nos moldes calvinistas e arminianos também rui. Deus não enxerga desde o início como será o final de Sua semana criativa não porque não queira ou não seja capaz, mas porque Ele está colocando tanto de Si no presente ato criador, que é justamente ali, e em nenhuma outra parte do tempo, que as coisas estão sendo de fato decididas. O que será ao final da criação Deus está construindo momento a momento. Cada verso que revela a atividade criativa de Deus possui em si mesmo um universo de suor divino. Isso fica bastante claro quando Deus avalia apenas posteriormente a beleza e utilidade de Suas invenções e atribui nomes às Suas criações inéditas. A realidade futura não existe e não pode ser observada até que Deus a tenha se decidido por ela e trabalhado para que ela ocorra. Gênesis 1 demonstra que Ele deseja reter esse poder.

O verso 27, por sua vez, aponta para o fato de que o homem herdou de Deus todas as características que o capítulo afirma que Ele possui. Deus tem o poder de trazer à existência coisas e situações totalmente inéditas e o homem também. Ambos são capazes de surpreender. Deus não cria em uma sucessão desesperada e irrefletida de comandos. Ele cria, observa Sua criação e avalia sua beleza, utilidade ou pertinência. O homem que foi justificado por Deus, e portanto foi restaurado à imagem e semelhança dEle, da mesma forma é capaz de avançar para o desconhecido mundo do ineditismo e posteriormente avaliar quão boa de fato foi sua investida. Tendo sido dotado de características similares às de Deus, o homem escreve o futuro junto com Ele. A diferença entre Deus e o homem consiste na amplitude do poder de ação: Deus escreve "futurões" e o homem escreve "futurinhos".

Entretanto, a conclusão que considero a mais importante de todas, tendo em vista tudo que foi aqui escrito, é a de que o adventista, em especial, é quem mais perde quando flexibiliza a literalidade de Gênesis 1 e abraça inadvertidamente o Deus do “eterno agora”. A santidade do sábado depende inteiramente de um entendimento literal da semana criativa. Se Deus não viveu momento a momento cada etapa criativa dos primeiros seis dias, tampouco descansou no sábado. Se Deus vive no “eterno agora”, não pode jamais ter descansado em algum sábado. E, se não o fez, por que deveríamos nós fazê-lo?

Creio que muito do que aqui foi exposto seja bastante intuitivo e natural para o cristão. Ouso dizer que nenhum ser neste mundo seria capaz de afirmar com a consciência tranquila que Deus não é livre. Mesmo quem afirma com profunda convicção que Deus decretou tudo desde o início sentirá uma repulsa por si mesmo no mais íntimo da alma se chegar a dizer, em sã consciência, que Deus não é livre para criar o que bem desejar, quando e como quiser. E quem afirmar que Deus anteviu todo o futuro desde a eternidade sabe que merecerá o inferno se apenas cogitar a possibilidade de que Deus não possui liberdade para transformar o futuro em algo diferente daquilo que Ele anteviu.

Parece ocorrer uma luta nas nossas mentes: temos uma clara intuição de que Deus é livre, ao mesmo tempo em que o deus atemporal nos persegue. Esse sofrimento é algo que certamente merece ser melhor descrito e a solução mais comum para ele é o compatibilismo, do qual quero aqui fugir a qualquer custo. É compreensível que muitos queiram desfrutar da auspiciosa visão de um Deus livre sem abandonar a segurança de um Deus platônico, mas não há como compatibilizar o Deus de Gênesis 1 com o de Platão e nisso é necessário insistir tanto quanto possível. Não haveria maior fracasso para o presente texto do que levar alguém a crer que Gênesis 1 pode se harmonizar com um Deus atemporal. Portanto, não quero aqui deixar qualquer margem para isso: ou Deus é Aquele que Gênesis descreve literalmente ou é o Deus atemporal e estaticamente onisciente de Platão, mas em hipótese alguma os dois ao mesmo tempo. Isso precisa ser dito sem titubeantes ressalvas. Quem optar pelo Deus literal de Gênesis avance adiante deixando inteiramente para trás a Grécia. Quem optar por ela, assuma todas as implicações de sua escolha, quer sejam boas ou más. A confusão de crer em duas fés antagônicas é um sofrimento desnecessário. A confusão de tentar fazer com que ambas façam sentido ao mesmo tempo é ainda pior e certamente não vale a pena. A tarefa é simplesmente irrealizável.

Com toda certeza, ainda há muito o que refletir e escrever a respeito de um Deus livre. Em realidade, estamos ainda no começo dessa maravilhosa descoberta que os intermináveis séculos esconderam. Se pararmos bem para pensar, é bastante surpreendente e mesmo motivo de efusivos louvores o fato de que, não obstante a enorme extensão de tempo durante a qual Satanás insistiu na divulgação de um deus imóvel e enjaulado, a liberdade de Deus esteja sendo redescoberta. A eloquência do texto bíblico é extraordinária e fala por si mesma. Se quisermos avançar para descobertas ainda mais vivas, impressionantes e poderosas, precisamos apenas deixá-la agir desimpedida.


Lucas Roberto Gonçalves

Morretes-PR, 21/05/2024



BIBLIOGRAFIA


1 Francisco Porfírio, Biografia de Santo Agostinho. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/biografia/santo-agostinho.htm.


2 Educabras, Aula sobre Santo Agostinho. Disponível em: https://www.educabras.com/aula/santo-agostinho.


3 Stanford Encyclopedia of Philosophy, Saint Augustine. Disponível em: https://plato.stanford.edu/entries/augustine/.


4 James Nichols, The Works of James Arminius, Vol. 1 (London: Printed for Longman, Hurst, Rees, Orme, Brown and Green, 1825), pp. 589-590.


5 John C. Peckam, Teodiceia do Amor – O Conflito Cósmico e o Problema do Mal. Casa Publicadora Brasileira, 2022.



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