Na última postagem, apresentei brevemente o IDE - Índice de Dificuldade Evangelística, que é um número que expressa a dificuldade de se evangelizar uma região.
Vamos lembrar: o índice é a soma da escassez de missionários, da escassez de recursos materiais e da intolerância religiosa em um região.
Por que foram escolhidos esses três critérios para compor o índice de dificuldade evangelística? Basicamente, os missionários, os recursos materiais e a liberdade religiosa são os principais recursos evangelísticos à disposição para se evangelizar uma região. Quanto maiores forem esses recursos, mais fácil tenderá a ser o trabalho missionário. Portanto, o IDE é uma medida de restrição de recursos evangelísticos em um determinado local e uma determinada época.
Aqui cabem alguns comentários importantes.
1 - Por se tratar de um número para um único lugar em uma única época, o IDE pode não capturar o histórico de avanços evangelísticos. O IDE não diz exatamente se uma região está pouco ou muito evangelizada, mas apenas indica algumas pistas a respeito disso. Consideremos, por exemplo, o caso da República Dominicana:
De 310 regiões contempladas pelo IDE, a República Dominicana é a 309º região mais fácil de ser evangelizada, porque ela possui muitos missionários, restrição material relativamente baixa e situação tranquila em relação à liberdade religiosa. Podemos nos perguntar: a República Dominicana já foi evangelizada? O IDE não dá uma resposta direta a essa pergunta, mas devolve outra pergunta: se existem tantos missionários (que aliás são resultado do próprio trabalho evangelístico), suficientes recursos materiais à disposição e caminho livre em termos de liberdade religiosa, não é razoável esperar que a obra missionária nesse lugar já esteja bastante avançada ou mesmo completa? Isso nos leva a um segundo comentário importante.
2 - O IDE pode não ser um indicador de avanço evangelístico, mas revela claramente quais são os lugares A RESPEITO DOS QUAIS NÃO PRECISAMOS ESTAR TÃO PREOCUPADOS. Quando o IDE de uma região é baixo, isso quer dizer que nesse lugar AS FORÇAS EVANGELÍSTICAS JÁ INSTALADAS são suficientes (ou mais que suficientes) para encerrar a obra. Já existe ali uma dinâmica evangelística vigorosa, QUE NÃO PRECISA SER INCREMENTADA. Vem-me à mente uma citação da Sra. Ellen White:
"O dinheiro gasto na ampliação das instituições em Battle Creek pode muito bem ser dedicado ao plantio da verdade nas cidades e lugares onde ainda não se apoderou. O dinheiro foi confiado a agentes humanos, para ser investido na obra do Senhor, distribuído aos trocadores e aumentado com o uso. Uma e outra vez os homens em posições de confiança colocaram diante deles a necessidade de que a vinha do Senhor fosse mais igualmente trabalhada. A vinha é o mundo, cada parte é do Senhor e deve receber a devida atenção. Nenhuma localidade deve engolir todos os recursos que podem ser obtidos para enriquecer, ampliar e multiplicar suas instalações, enquanto as maiores partes do campo são deixadas sem recursos. Esta política não é inspirada por Deus. Os chamados graciosos de misericórdia devem ser dados a todas as partes do mundo. O campo de Deus é o mundo."
Spalding and Magan Collection, p. 13
Vejam: a fim de que a vinha do Senhor seja mais igualmente trabalhada, o mínimo que se pode fazer é interromper o fluxo de recursos para lugares onde já existe uma dinâmica evangelística robusta. O que há por se investigar é apenas o quanto dos recursos na Republica Dominicana poderiam ser alocados em lugares com maior dificuldades evangelísticas. Sabemos bem que já existe uma tendência natural para a preservação dos recursos evangelísticos em uma região: muito dos recursos materiais não consegue sair facilmente do país. O mesmo é válido para os missionários: muitos não desejam e nem deveriam sair de suas terras. O que é certo, de qualquer modo, é que incrementar os esforços evangelísticos em lugares com IDE baixo não se encaixa no plano divino. E se alguém ainda tem alguma dúvida de que isso acontece, basta olhar para o Projeto Calebe.
Para ilustrar o que estou querendo dizer, vamos considerar um caso comum no Projeto Calebe: um grupo de jovens adventistas do sul do Brasil, digamos da Associação Central Paranaense, vai fazer evangelismo no Mato Grosso do Sul. Vejamos o que isso significa:
As duas regiões possuem o mesmo nível de liberdade religiosa e o mesmo acesso a recursos materiais, porém a região central do Paraná é um pouco mais escassa em matéria de missionários do que o Mato Grosso do Sul. Lembremos de mais uma passagem da Irmã White:
“Há os que pensam que têm a obrigação de pregar a verdade, mas não ousam aventurar-se a sair da praia, e não pescam nenhum peixe. Preferirão andar entre as igrejas, repassando sempre o mesmo terreno. Informam que apreciaram muito, que fizeram uma boa visita, mas em vão esperamos pelas almas que estariam convertidas à Verdade por meio de sua cooperação. Esses ministros navegam próximo demais à praia. Avancem eles para o mar alto, e lancem as redes onde estão os peixes. Não há falta de trabalho para ser feito. Poderia haver centenas empregados na vinha do Senhor, onde agora um único.”
The True Missionary, fevereiro de 1874
Vejam só: os jovens do Projeto Calebe que saem do Paraná em direção ao Mato Grosso do Sul para fazer evangelismo estão momentaneamente aumentando o número de missionários em um lugar que já está mais abarrotado de missionários que a própria região onde moram. Trata-se de um deslocamento cujo propósito é reduzir as forças evangelísticas de um lugar mais necessitado de obreiros e aumentar as forças evangelísticas em um lugar menos necessitado. Os jovens adventistas são mais úteis na região central do Paraná do que no Mato Grosso do Sul. A Irmã White alertou para aqueles que não ousam a sair da praia e ir para o mar alto, mas o Projeto Calebe costumeiramente é pior que isso: quem está na praia anda ainda mais para trás, para mais longe do mar. É como entrar mangue adentro para pescar caranguejos. Isso nos leva ao terceiro e último comentário.
3 - A ilustração da praia e do mar alto usada pela Sra. White é a mais oportuna para explicar qual é a ideia do IDE. Quanto maior o IDE, mais mar adentro é a região. Quanto menor, mais próximo à praia. Levando em conta que a vinha do Senhor é o mundo, um IDE de 0 a 0.30 pode ser considerado praia e aí estão todas as regiões do Brasil (a pior região é o Piauí, com IDE de 0.25) e da América do Sul, o Canadá (0.17), os EUA (0.18 a 0.23), toda a América Central, grande parte da África e considerável parte da Europa. A partir de 0.30, estamos entrando na água: Bulgária (0.31), Timor-Leste (0.33). Quando chegamos a 0.40, já não dá pé: Senegal e Camboja (0.40). A partir daí a coisa começa a ficar feia e as ondas causam medo: Tailândia (0.44) e Vietnam (0.45). De 0.50 em diante, só de barco: Bangladesh (0.54) e Tunísia (0.57). Em 0.60, já não enxergamos a praia: Turquia (0.60) e Paquistão (0.61). Nesse ponto, olhamos para ainda mais longe mar adentro e enxergamos uma tempestade grotescamente assustadora: Síria (0.80). Aqui, medo talvez já não seja a melhor palavra. Melhor substituí-la por desespero.
O IDE não quer dizer que todos nós deveríamos ir para a Síria, embora não seja má ideia, mas que ao menos deveríamos nadar um pouco mais para dentro de onde estamos.
"Faze-te ao mar alto, e lançai as vossas redes para pescar."
Lucas 5:4 - ACF
Que Deus abençoe a todos!
Lucas
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