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Foto do escritorEconomia e Evangelismo

O problema das profecias na teologia tradicional



Na teologia tradicional, Deus enxergou todo o futuro desde o princípio. Ele viu todos os grandes acontecimentos e também os pequenos, inclusive cada uma de nossas escolhas. Nessa visão, as profecias nada mais são que uma revelação de Deus a respeito desse futuro que Ele sempre conheceu.

Na realidade, para a teologia tradicional todo futuro JÁ ACONTECEU para Deus, uma vez que Ele vive naquilo que Santo Agostinho chamou de eterno agora. Portanto, nessa perspectiva o futuro é um fato concreto para Deus e uma profecia nada mais é que uma decisão de Deus de revelar a nós esse fato concreto.

Se todas as profecias bíblicas, ou ao menos a maior parte delas, pudessem ser compreendidas a partir dessa perspectiva, não haveria necessidade de propor uma nova abordagem, entretanto esse entendimento tradicional a respeito das profecias abarca apenas um número muito limitado delas. Muitos casos de profecias na Bíblia desafiam essa visão. Vamos ver alguns.


Jonas 3:4: Jonas entrou na cidade e a percorreu durante um dia, proclamando: “Daqui a quarenta dias Nínive será destruída”.


Na abordagem tradicional, como entendemos essa profecia? Entendemos da seguinte forma: Deus, ao ter enxergado todo o futuro desde o princípio, viu como um fato concreto a cidade de Nínive destruída 40 dias após a mensagem de Jonas. Porém, leiamos o texto um pouco mais adiante.


Jonas 3:10: Tendo em vista o que eles fizeram e como abandonaram os seus maus caminhos, Deus se arrependeu e não os destruiu como tinha ameaçado.


O que ocorreu? Nínive não foi destruída 40 dias após a mensagem de Jonas, como a profecia sugeria. Temos assim um impasse: se Deus enxergou desde o princípio a cidade de Nínive destruída após a mensagem de Jonas, Sua onisciência falhou, o que é inconcebível. E se Deus enxergou desde o princípio a cidade de Nínive não sendo destruída após a mensagem de Jonas, a profecia era falsa, pois declarava com todas as letras que a cidade seria destruída. Assim podemos dizer que a abordagem tradicional nos coloca diante de uma escolha muito indigesta: temos que optar por um Deus que falha ou por um Deus que mente.

Normalmente, os teólogos optam pelo Deus que mente, argumentando que a mensagem “Daqui a quarenta dias Nínive será destruída” foi apenas uma forma de Deus cumprir Seus desígnios. Isso não melhora a questão: nesse caso, Deus cumpre Seus desígnios mentindo. Vamos lá: segundo a teologia tradicional, Deus desde o princípio enxergou a cidade de Nínive NÃO SENDO destruída. Quando Ele diz ao povo de Nínive, por meio de Jonas, que a cidade será destruída, Ele prega naquele povo uma espécie de logro. E se a preservação de Nínive já era um fato dado, uma vez que para Deus o futuro é um fato concreto, qual a necessidade de aplicar uma mentira? Deus sabe com toda certeza que aquilo não vai acontecer. Por que Ele diz que vai? Isso é absolutamente desnecessário. A não destruição de Nínive já é um fato concreto para Deus desde a eternidade. Porque Ele precisaria dizer algo específico, aliás uma mentira, para que ocorra algo que na realidade já ocorreu? A lição que a teologia tradicional ensina aos nossos filhos é: “uma mentirinha não faz mal”.


Uma outra situação semelhante é a que ocorre em 1 Samuel 2:30:


"Portanto, diz o Senhor Deus de Israel: Na verdade, tinha falado eu que a tua casa e a casa de teu pai andariam diante de mim perpetuamente; porém agora diz o Senhor: Longe de mim tal coisa, porque aos que me honram honrarei, porém os que me desprezam serão desprezados."


Deus aqui está dizendo que havia revelado que os descendentes de Eli seriam sacerdotes eternamente. A interpretação da teologia tradicional dirá que Deus já havia enxergado como um fato concreto os descendentes de Eli sendo sacerdotes para sempre, mas ambos seus filhos morrem sem deixar herdeiros. Surge o mesmo problema: se Deus enxergou como um fato concreto a permanência dos herdeiros de Eli como sacerdotes, Ele enxergou errado. E se Deus enxergou como um fato concreto os filhos de Eli morrendo sem deixar filhos, então a profecia era falsa.

Agora esse caso é um pouco mais bizarro que o anterior: os teólogos novamente vão dizer que Deus desde o princípio enxergou os filhos de Eli morrendo sem deixar herdeiros. A afirmação de que os descendentes de Eli seriam sacerdotes para sempre era só uma forma de Deus atingir Seus desígnios. Mas nesse caso, não se trata apenas de uma mentira. Nesse caso, o pior de tudo é que era desígnio de Deus, desde a eternidade, que Seus sacerdotes fossem mortos ainda jovens em uma batalha contra uma nação pagã, pois foi assim que os filhos de Eli morreram. Os teólogos responderão: claro que não! Deus queria que eles vivessem. O problema piora: os teólogos estão proponde que quando Deus abre os olhos, lá na eternidade, Ele vê os dois sacerdotes já mortos e sem herdeiros. Ele até queria que fosse diferente, mas não pode fazer nada a respeito… Na visão tradicional a respeito das profecias, a onipotência de Deus é nula.

Situação parecida ocorre em 2 Reis 20:1. Ali Deus anuncia o futuro ao Rei Ezequias que ele morrerá em breve. Acaba que o Rei Ezequias vive ainda mais 15 anos. Se Deus enxergou a morte iminente de Ezequias como um fato concreto, a profecia estava errada. E se Deus enxergou uma vida mais longa de Ezequias como um fato concreto, a profecia é falsa.

Por fim, vejamos Jeremias 18:7-10. Ali está sendo dito que uma nação não será destruída se houver arrependimento, mesmo após uma profecia ser dada. Ora, o próprio Deus está aqui dizendo que uma revelação que Ele dá a respeito de uma nação não tem um caráter permanente e portanto não é um fato concreto que Ele enxergou no futuro.

Há uma lista grande de versos bíblicos com problemáticas similares, mas os que foram apresentados já ilustram o ponto: Esses trechos e muitos outros desafiam a visão tradicional a respeito das profecias, porque muitas das profecias bíblicas não são simplesmente uma revelação certa de um futuro já conhecido por Deus. Essas profecias aqui apresentadas, que podemos chamar de condicionais, são um duro golpe na ideia de um futuro fixo e portanto na interpretação tradicional a respeito de profecias.

Um último detalhe que precisa ficar claro antes desse texto terminar: o problema todo não está com Deus, mas com a loucura dos homens. Deus é perfeito. Imperfeita é a teologia.

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